Ó Portugal, és tão pouco português!

Ó Portugal, és tão pouco português!

Vivo em Portugal, sou português.

Desgovernado cidadão, mal sabe inglês. 

Come o pão e subsiste de pensões,

Paga impostos sem isenções. 

Sobrevive calado e morre surdo,

Pobre país onde a pobreza é assunto mudo.

Os filhos dos outros são sempre conversa,

Numa nação que é tudo ou mais que perversa. 

Vandalismo e ataque ao poder,

Lá vai o tempo onde a sede era dar que beber.

Fome e miséria num estado infernal,

Querem todos viver do subsídio de Natal.

Sou pobre e infeliz, 

Não roubo nem digo o que sempre quis.

Conto os tostões ao final do mês

Porque nunca tive a sorte de ser marquês. 

As cadeiras já ardem de argumento, 

Vêm eles com as ladeias de tanto lamento. 

Numa assembleia perdida pela pátria, 

Citam Camões e Pessoa com tanta sátira.

25 de abril e Revolução.

Afinal, o que fizeram eles pela população? 

Proclamam a mulher e o feminismo 

Mas sabem o que falta mesmo? É humanismo. 

Pintura, arte, olaria e cultura.

E onde fica o combate à conjuntura? 

Filas e filas por uma vida melhor,

Vai ao estrangeiro que o salário lá é maior! 

O bebé vai nascer em pleno verão, 

Num mundo onde a resposta é um simples não. 

Triste de quem se esforça para sustentar,

Numa casa inteira onde a escassez está no próprio lar. 

Vivo em Portugal, país de poetas. 

Cultos insanos, desgraçados profetas. 

Vivo em Portugal, sou português. 

Não sei falar outras línguas, mas sou bom freguês.

Vivo em Portugal, sigo a religião. 

Tenho a dizer “que pobre esta governação!”. 

Que dor e angústia a minha tal,

Esqueceram-se da saúde, que é o mais fundamental. 

Vivo em Portugal, vejo a televisão, 

Nos jornais diários em que a tragédia é a melhor solução 

Já nem reconheço o sítio onde estou. 

Sei de onde venho, mas não sei para onde vou. 

Alberto Couto