Muita gente tem pedido – ou, no mínimo, concorda que alguém no mundo (leia-se “Twitter”) peça – boas adaptações cinematográficas de videojogos, nomeadamente para o pequeno ecrã. E a verdade é que esse desejo tem sido realizado e continuará a ser realizado até, pelo menos, 13 de março com The Last Of Us.
Sou fã do jogo original e da sequela, mas admito não ter entrado no hype train. A ideia de ter uma série televisiva – se é que ainda se pode considerar “televisiva” – daquele que é um marco da história dos videojogos, com o envolvimento direto das entidades responsáveis pelo material original e com o selo de garantia da produtora de Game Of Thrones, é absurda. E é absurda pelo simples facto de que estas adaptações – até mais ou menos agora, vá – mal funcionam e, quando funcionam, funcionam mal. É que, a meu ver, o popular mito Video Game Adaptation Curse ainda cá vagueia e, para efeitos de discussão, refiro-me exclusivamente a produtos live-action (perdoa-me, Castlevania).
Como o nome poderá indicar, trata-se de uma suposta maldição que dita que qualquer adaptação de um videojogo para o pequeno ou grande ecrã está condenada a ser lixo; e temos muito lixo por onde pegar, basta ver por esta lista do Rotten Tomatoes. Temos de admitir que parte disto é culpa nossa e, claro, do Uwe Boll – se bem que não é fácil de encontrar um realizador de cinema que admita que os seus próprios filmes são feitos para lavar dinheiro. No entanto, algo está a mudar…
Fui ver Avatar 2 ao cinema com um amigo e, ao sairmos do cinema, ele diz “Parece um videojogo”; e eu concordei. É engraçado pensar que o James Cameron passou mais de uma década a investir em tecnologia de underwater motion-capture para chegarmos a uma fase do nosso entretenimento em que já não dizemos “Parece um filme” ao jogar um jogo, mas sim “Parece um jogo” ao ver um filme. Em 2009, quem dera aos jogos parecerem-se minimamente com o Avatar – nem o jogo oficial o conseguiu! – mas, hoje em dia? Quem dera ao Avatar 2 ser como um jogo… E parte da culpa disto é, precisamente, do The Last Of Us (2013) – que, ironia do destino, se encontra agora na vanguarda para quebrar, superficialmente, a maldição das adaptações de videojogos.
Eu, contrariamente ao que os jornalistas e revistas reputadas que eu cito abaixo afirmam, acredito que a maldição (ainda) existe. Por longos anos, notou-se que os responsáveis destas adaptações estavam “always bent on doing something easy or different” e que “the people who made them had little understanding of the games they were adapting”. Na minha opinião, a pior ofensa é mesmo quando os “makers behind these films […] aren’t fans” – The Witcher, não? (Sim.) Mas nos últimos anos, notou-se uma mudança de paradigma. O que é que Detetive Pikachu, os dois filmes do Sonic e agora TLOU têm em comum? Contrariamente aos filmes do passado – ou até atuais, não é, Uncharted? –, foram feitos com propósito e respeito pelo material de origem, pelos fãs e por potenciais novos fãs. O que é que isto nos indica? Que tanto os atuais responsáveis pela produção de uma adaptação como os contratados para a criar gostam do material de origem; e isto só acontece se for pessoal que cresceu a jogar. É que os filmes que se inspiram em jogos fazem sucesso: Jumanji, Ready Player One, Wreck-it Ralph e Tron; dois são marcos culturais e tudo que bastou foi serem feitos como um bom filme normalmente é.
Seria negligente não referir que jogos como The Last Of Us são, por natureza, muito mais “cinema” que Super Mario e Mortal Kombat eram quando surgiram. Para adaptar TLOU – e sem querer retirar crédito aos que trabalham na série, atenção –, basta seguir o que a narrativa do jogo já nos dá. Ou seja, há a possibilidade de ser mais fácil atualmente de alcançar uma adaptação satisfatória do que há 20 anos. Mas depois lembro-me do que jogos como Alone In The Dark, Silent Hill, Resident Evil, Uncharted, Tomb Raider já ofereciam quando surgiram e o que acontece nos seus respetivos filmes e este argumento perde força. Acaba por ser uma espada com dois gumes, mas um dos gumes está claramente mais frouxo que o outro.
Adivinha-se que estes próximos anos nos tragam muitas adaptações, com conversas sobre Borderlands, Gran Turismo, Ghost of Tsushima e adaptações de adaptações de Tom Clancy. Entretanto, é esperar para ver como TLOU se comporta e de que outras maneiras James Cameron avançará o meio; o próximo passo será, certamente, conseguir gravar no meio das chamas.
Joaquim Duarte