Os filmes da Marvel, tal como alguns nomes de peso o dirão, não se podem considerar cinema. Motivos para isso incluem todo o espetáculo de CGI a que obrigam mas, mais importante ainda, o facto de que estes filmes requerem fundamentalmente que os protagonistas sobrevivam independentemente das probabilidades – geralmente –, diminuindo o impacto que os filmes têm de antemão. Mas eis que habemus James Gunn.
O realizador-guionista é, de longe, o melhor que a Marvel tem à disposição, algo que a própria DC sabe e aproveitou com a controvérsia do despedimento de Gunn da Marvel em 2018. Este Guardiões da Galáxia é facilmente o melhor filme pós-Endgame e, sinceramente, pode-se considerar até um concorrente direto à qualidade dos primeiros filmes da MCU. Portanto, comecemos pelo início.
Escusado será dizer que convém acompanhar a MCU para se perceber o filme desde o início. Existe um Holiday Special dos Guardiões que, ao que parece, convém ver. No entanto, isto não afeta muito além dos 15 minutos iniciais do filme. Algo a notar é o quão incrivelmente sonoro o filme é; mas isto não é um elogio. As personagens berram constantemente – roça o infantil – e, embora as escolhas musicais de Gunn continuem fantásticas, os meus ouvidos sofreram com os decibéis. O último aspeto negativo é que, por mais que este filme procure o intermédio entre os géneros “super-heróis” e “ação/comédia/drama”, continua a ser um filme de final feliz.
No entanto, a demanda por este intermédio é também um ponto forte. James Gunn é mais que capaz de matar personagens – é só ver The Suicide Squad – e a história principal deste filme consegue uma gravidade emocional que se via ilusiva desde a morte do Tony Stark. Grande parte deste impacto deve-se à exploração muito bem conseguida da história de origem do Rocket (Bradley Cooper) e de todo o trabalho à volta do Alto Evolucionário (Chukwudi Iwuji) – que termina assim, diga-se de passagem, como um dos melhores vilões da MCU. Sendo potencialmente o último filme dos Guardiões, a vida pessoal dos membros é posta à prova de uma maneira ou de outra, direta ou indiretamente, e o resultado é mais que satisfatório.
O filme é muito bonito de se ver, o humor e as personagens estão todas bem conseguidas – até o Howard the Duck encontrou o seu sítio – e o andamento do filme não se confunde com velocidade – ou seja, vê-se bem. As referências pop e todo o trabalho mostram que o James Gunn, um óbvio comic book geek (a sério, vejam a filmografia dele), é a pessoa mais terra-a-terra e equilibrada no que toca à mistura de fantasia, ficção científica e realidade. E a repetição de atores, incluindo o irmão Sean Gunn (nepotismo, deixem-me rir), demonstram que só fala mal dele quem não sabe o que é cinema.
Dito isto, será este um filme digno de “verdadeiro cinema”? A resposta é não… Porque num mundo em que The Room e Salò são filmes, os da Marvel sempre foram cinema. Este apenas encapsula melhor o “tradicional” com o “super-herói”: não se esquece que é sobre super-heróis mas sabe que é mais que isso, algo que já não se via no MCU há uns bons anos. E é este o caminho que a Marvel deve seguir – tal como a DC já se apercebeu. De 0 a 5, 4; de 0 a 10, 8.5.
Guardiões da Galáxia Volume 3 encontra-se atualmente em exibição nos cinemas para M/12 e tem cerca de 149 minutos – que passam bem – e duas cenas pós-créditos (uma mid e uma post, vá).
Joaquim Duarte