The Northman ou O Homem do Norte (tradução literal que está a ser utilizada na distribuição do filme em Portugal) é um revenge movie épico situado nebulosamente na época, para falta de um melhor termo, dos vikings.
Este é o terceiro longa-metragem do realizador estadunidense Robert Eggers, que se tem vindo a cementar desde o The Witch de 2015, como um querido da crítica e uma espécie de underdog. Isto deve-se ao facto do filme, anteriormente referenciado, não ter sido um sucesso de bilheteira, e por o The Lighthouse, de 2019, ter falhado em receber qualquer nomeação para os Óscares, ao contrário do que teria sido especulado.
Embora não tenha conseguido, até à data, penetrar o mainstream (admito que esse nunca me tenha parecido ser o objetivo do realizador), Eggers encontrou um público fiel dentro dos admiradores da A24 (a distribuidora, não a autoestrada), que distribuiu os dois primeiros filmes do realizador.
Robert Eggers é frequentemente comparado aos restantes realizadores associados ao guarda-chuva da A24, nomeadamente Ari Aster, realizador do fantástico e promissor Hereditary e da obra-prima em termos estéticos, mas ultimamente vápida, Midsommer. Apesar da associação, o trabalho de Eggers sempre me pareceu vastamente mais substancial do que o dos seus contemporâneos, com os quais ele é erroneamente associado.
Por eu me considerar uma pessoa bastante ritualista, decidi abordar o The Northman sem ter visto absolutamente nada sobre o filme, nem mesmo uma foto. Talvez na esperança que a magia de ser positivamente surpreendido por um filme, da mesma forma que fui da primeira vez que vi The Witch, se repetisse, e de certa forma a experiência foi replicada, dentro do possível.
The Northman, é um filme sobre a jornada de vingança de Amleth (Alexander Skarsgård), um príncipe que se infiltra como escravo para matar o assassino do seu pai e salvar a sua mãe.
A história, em si, não é algo que nunca tenhamos visto antes. O que a torna especial, é a atmosfera do filme, que foi capaz de me prender de tal forma que esqueci completamente que estava numa sala de cinema. Algo ao qual Eggers já habituou o seu público, é ao rigor histórico e à fidelidade às ideias da época, cometendo-se a elas a 100%, mesmo que essas causem desconforto nos tempos que correm.
Algo que também prende o espectador é a elevada quantidade de violência, algo que me surpreendeu, mas não deveria, sendo os vikings historicamente conhecidos pelos seus atos de crueldade. Aliás, a violência é o tema central do filme, e esta dá-nos um dos momentos mais brilhantes do filme que, infelizmente, é um spoiler, o que me impede de falar desse momento na íntegra.
O cinema pode ser reduzido na sua forma mais básica à comunicação de ideias dos seus autores como público e, na minha opinião, é uma prova de mestria por parte dos seus autores, quando estes conseguem convencer o seu público de ideias que eles não acreditam. Isto acontece de forma genial no “O Homem do Norte”. A meio do filme, dei por mim mesmo a torcer por comportamentos que repudiei no início deste. É como se eu tivesse sido contagiado pelo espírito de vingança do personagem principal.
Em termos técnicos, o filme possui uma cinematografia fantástica, com planos absolutamente brilhantes que não se tratam de exibicionismo puro, mas que ajudam a realçar o significado e simbolismo de certas cenas. O filme tem uma trilha sonora tribal épica e imersiva, que tornam as várias cenas de rituais nórdicos ainda mais psicadélicas e envolventes. Se há uma palavra que possa descrever a direção artística deste filme é “hipnotizante”.
The Northman, faz jus ao trabalho prévio do realizador e, ao mesmo tempo, ajuda a desenvolver e a expandir o seu estilo pessoal. Embora o The Witch continue a ser o meu trabalho favorito, é inegável que Eggers prossegue num percurso fascinante pela qualidade e consistência que tem demonstrado. Existem vários exemplos de realizadores que tem um único filme fantástico, seguido por um monte de mediocridade, por contraste, Eggers prova filme atrás de filme que não é um desses casos. Recomento fortemente O Homem do Norte, e recomendo também que este seja visto numa sala de cinema, para que a sua hipnose seja mais eficaz.
Hélder Silva