Psicologia et Al: Burnout

Psicologia et Al: Burnout

O que é o “burnout”?

O burnout, “queimar até à exaustão”, resulta de situações de ansiedade e stress prolongados, originando exaustão física, mental ou até mesmo emocional, prejudicando, assim, a qualidade de vida do sujeito. Além disso, é uma problemática que acontece de forma silenciosa, que é detetada num estado avançado quando os problemas subjacentes já são notórios, como por exemplo: a autoestima é afetada, assim como a saúde mental do indivíduo; o desempenho não é eficiente, seja profissional ou académico; a tomada de decisão fica prejudicada, assim como as relações sociais. (Robins et al., 2015)

Inicialmente, o período de transição para o ensino superior é vivenciado com sentimentos de ansiedade face às novidades e às exigências institucionais e académicas, em virtude das demandas relacionadas ao curso e à instituição, às relações interpessoais, à quebra de expectativas, ao excesso de carga horária, aos problemas financeiros, ao isolamento familiar, às reprovações, à falta de tempo para estar com amigos e para descansar, à falta de competência, à impotência e à incerteza. (Mucavêa et al, 2020)

Os estudantes universitários, assim como os professores enfrentam alguns cenários que causam ansiedade e pressão, que pode levar ao “burnout”, como por exemplo o facto da carga horária ser insuficiente para entregar tarefas académicas, fazer os trabalhos e preparar as respetivas apresentações, bem como estudar para os testes de avaliação e não só, tendo ainda a pressão direcionada aos relacionamentos interpessoais, aos problemas financeiros que a universidade acarreta, às reprovações… (Navarro-Abal et al, 2018). As demandas resultantes do ritmo de vida frenético dos estudantes, as solicitações académicas e a baixa incidência de atividade física dessa população podem ser alguns dos indicadores da síndrome de Burnout. Os professores são o outro lado da moeda, que estão expostos aos mesmos problemas que os alunos, visto que têm que cumprir com datas e metas de ensino e colaborar nos projetos dos discentes e ainda fazer a respetiva correção. É importante salientar que estes também passam pelas mesmas dificuldades pessoais que os seus alunos.

Antes de avançarmos…

Penso que o estudo de Asikainen et al. (2020) ilustra o que no fundo já sabemos – que mesmo que tenhamos uma profunda paixão pela nossa área, pelo trilho que escolhemos, isso não nos protege do burnout. Passar pela experiência de burnout não faz de nós más pessoas, pessoas não-merecedoras ou incapazes. É um tema do qual não falamos, pelo significado inerente: “Eu não sou bom o suficiente/Se estou assim, é porque na verdade não amo aquilo que faço”. Não é verdade.

Penso que nestes casos ajuda entender de que o que somos num determinado momento não é tudo o que somos. Da mesma forma que um raio de luz decomposto num prisma não é apenas uma das suas cores, ou que uma fotografia é apenas um momento estático num tempo que flui – os nossos momentos menos positivos não nos definem absoluta e permanentemente. Ainda assim, estes devem ser aceites com naturalidade, não negados ou repudiados.

Porque é que te deves preocupar?

Uma revisão literária de Rosales-Ricardo et al. (2021) apurou que a prevalência global de burnout ronda os 40% entre universitários, com as maiores taxas, por ordem, nos cursos de medicina, enfermagem, engenharia e tecnologias da informação. Existindo taxas menores entre alunos das artes, ciências sociais e gestão. Contudo, estes resultados são contestados por estudos como o de Caballero et al. (2007), que identificam uma taxa de 41.6% dos alunos de psicologia.

Assunção e Marôco (2020) estimam que um em cada três universitários toma algum tipo de medicação, devido aos estudos – nomeadamente para a ansiedade, depressão, melhoria do desempenho cognitivo ou problemas de sono. Segundo Salmela-Aro et al. (2009), o burnout académico encontra-se associado à depressão.

O burnout pode levar ao consumo excessivo de álcool ou de outras substâncias (Aguayo et al., 2019) e à erosão do comportamento moral, segundo Dyrbye e Shanafelt (2015) – preocupante para todos os profissionais, que devem seguir um quadro de ética e contactam com o público.

Ao contrário do que pode ser disseminado nas redes sociais, o burnout não é, e não deve ser “normal” ou visto como um ritual de passagem – é uma síndrome psicológica a ser prevenida e tratada. Tanto que Robins et al. (2017), avisa que o burnout durante a universidade é um preditor para o mesmo durante a prática profissional, ou seja, o burnout não-tratado segue-te!

McNichols (2021) explica que a irritabilidade e cinismo também têm efeito nas nossas relações pessoais – levando a sentimentos de distância, menor excitação ou capacidade de conectar e menor interesse sexual.

“… Ok, estou alerta, o que podemos fazer?”

A maioria das técnicas de prevenção e tratamento do burnout assumem que a origem da síndrome advém do indivíduo, e não do possível contexto de trabalho disfuncional. Neste caso é relevante incluir programas que aumentem a autoconsciência dos profissionais e para melhorar a sua resiliência e envolvimento com a profissão. (Lima & Dolabela, 2021)

Silva e colaboradores (2016) agruparam um conjunto de estratégias de intervenção para a prevenção e tratamento da síndrome de burnout. Essas estratégias são: Estratégias individuais: treinar a solução dos problemas, a assertividade e programas para rentabilizar o tempo da melhor maneira; Estratégias de grupo: apoio social no trabalho/escola por parte dos colegas e dos superiores; Estratégias organizacionais: programas de prevenção que visam melhorar o clima da organização.

Um fator protetor importante é o sentido de coerência – orientação global da vida, que a torna compreensível, gerenciável e lhe dá significado, segundo Antonovsky (1979). Se não sabes para onde vais, o caminho é mais cansativo. (Asikainen et al., 2020) partilham que o estilo de estudo pode predispor-nos ao burnout. Alunos que estudam “superficialmente” e apenas memorizam a matéria ficam mais exaustos do que aqueles que se organizam ou aprendem a matéria “a fundo”.

Ye et al. (2021) identificam a importância do apoio social, que afeta a satisfação com a vida (bem-estar interno subjetivo) através da ativação do otimismo. É verdade que o otimismo pode ser uma disposição inata, mas também pode ser desenvolvido e adquirido com o apoio de um psicólogo. Além disso, o otimismo é um fator preditor da adaptação à universidade, como aponta Brissette et al. (2002) e também se encontra relacionado, segundo Aspinwall e Taylor (1992) a uma melhor saúde mental e fisiológica entre alunos universitários.

Este é o espaço do Núcleo de Estudantes de Psicologia, que resulta de uma parceria com o teu jornal académico – O Torgador. Se também gostavas de protagonizar o teu espaço no jornal académico sobre temas relevantes para a academia, contacta-nos através de direcao@otorgador.pt.

Este artigo teve como referências bibliográficas:

Aguayo, R., Cañadas, G., Assbaa-Kaddouri, L., Cañadas-De La Fuente, G., Ramírez-Baena, L., & Ortega-Campos, E. (2019). A risk profile of sociodemographic factors in the onset of academic burnout syndrome in a sample of university students. International Journal of Environmental Research and Public Health, 16(5), 707. https://doi.org/10.3390/ijerph16050707

Antonovsky, A. (1979). Health, stress and coping (the Jossey-Bass social and behavioral science series) (1st ed.). Jossey-Bass Inc Pub.

Asikainen, H., Salmela-Aro, K., Parpala, A., & Katajavuori, N. (2020). Learning profiles and their relation to study-related burnout and academic achievement among university students. Learning and Individual Differences, 78, 101781. https://doi.org/10.1016/j.lindif.2019.101781

Aspinwall, L. G., & Taylor, S. E. (1992). Modeling cognitive adaptation: A longitudinal investigation of the impact of individual differences and coping on college adjustment and performance. Journal of Personality and Social Psychology, 63(6), 989–1003. https://doi.org/10.1037/0022-3514.63.6.989

Assunção, H., & Marôco, J. (2020). Use of medication in university students with burnout. Psicologia, Saúde & Doença, 21(01), 15–21. https://doi.org/10.15309/20psd210104

Brissette, I., Scheier, M. F., & Carver, C. S. (2002). The role of optimism in social network development, coping, and psychological adjustment during a life transition. Journal of Personality and Social Psychology, 82(1), 102–111. https://doi.org/10.1037/0022-3514.82.1.102

Caballero, C. C., Abello, R., & Palacio, J. (2007). Relación del burnout y el rendimiento académico con la satisfacción frente a los estudios en estudiantes universitarios. Avances En Psicología Latinoamericana, 25(2), 98–111. http://www.scielo.org.co/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1794-47242007000200007

Dyrbye, L., & Shanafelt, T. (2015). A narrative review on burnout experienced by medical students and residents. Medical Education, 50(1), 132–149. https://doi.org/10.1111/medu.12927

Lima, S. S. F., & Dolabela, M. F. (2021). Estratégias usadas para a prevenção e tratamento da Síndrome de Burnout. Research, Society and Development, 10(5), 1-19. https://doi.org/10.33448/rsd-v10i5.14500

McNichols, N. K. (2021, December 8). How burnout can affect your relationship. Psychology Today. Retrieved February 12, 2022, from https://www.psychologytoday.com/us/blog/everyone-top/202112/how-burnout-can-affect-your-relationship

Mucavêa, P., Abacar, M. & Aliante, G. (2020) Burnout em estudantes de Psicologia em uma  universidade pública em Moçambique. Trabalho En(Cena), 5(1), pp. 163-180. 10.20873/25261487V5N1P163

Navarro-Abal, Y., Gómez-Salgado, J., López-López, M., & Climent-Rodríguez, J. (2018). Organisational Justice, Burnout, and Engagement in University Students: A Comparison between Stressful Aspects of Labour and   University Organisation. International Journal of Environmental Research and Public Health, 15(10), 2116.               http://dx.doi.org/10.3390/ijerph15102116

Robins, T., Roberts, R., & Sarris, A. (2015). Burnout and engagement in health profession students: The relationships between study demands, study resources and personal resources. The Australasian Journal of Organisational  Psychology, 8.https://doi.org/10.1017/orp.2014.7

Robins, T. G., Roberts, R. M., & Sarris, A. (2017). The role of student burnout in predicting future burnout: Exploring the transition from university to the workplace. Higher Education Research & Development, 37(1), 115–130. https://doi.org/10.1080/07294360.2017.1344827

Rosales-Ricardo, Y., Rizzo-Chunga, F., Mocha-Bonilla, J., & Ferreira, J. P. (2021). Prevalence of burnout syndrome in university students: A systematic review. Salud Mental, 44(2), 91–102. https://doi.org/10.17711/sm.0185-3325.2021.013

Salmela-Aro, K., Kiuru, N., Leskinen, E., & Nurmi, J. E. (2009). School burnout inventory (SBI). European Journal of Psychological Assessment, 25(1), 48–57. https://doi.org/10.1027/1015-5759.25.1.48

Silva, A. B. N., Maximino, D. A. F. M., Souto, C. G. V., & Virgínio, N. S. (2016). Síndrome de burnout em profissionais de enfermagem na unidade de terapia intensiva. Revista de Ciências da Saúde Nova Esperança, 14(1), 79-86. https://doi.org/10.17695/revcsnevol14n1p79-86 

Ye, Y., Huang, X., & Liu, Y. (2021). Social support and academic burnout among university students: A moderated mediation model. Psychology Research and Behavior Management, Volume 14, 335–344. https://doi.org/10.2147/prbm.s300797

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