O Ensino Superior e a generalização absurda

O Ensino Superior e a generalização absurda

“Já todos sabemos das dificuldades que atravessamos neste momento” seria a frase com que gostaria de começar este artigo. “Já todos sabemos que medidas tomar e que comportamentos adotar para o ultrapassar” seria a frase com que gostava de o prosseguir. No entanto, passadas semanas desta pandemia ter chegado a Portugal e meses depois de ter emergido no mundo, ainda existe um grupo da população, ou que por não ter televisão, ou que por não ter cérebro, ignora todas as recomendações. Na verdade, é tudo um exagero.

Centremo-nos numa das parcelas altamente prejudicada e que teve de ser adaptada de modo a garantir a sua continuidade, o ensino. Constantemente abordado nos meios de comunicação social, o ensino é, no entanto, reduzido às escolas, isto é, ensino básico e secundário. ‘Ensino Superior’: duas palavras que não me lembro de ver em nenhum oráculo televisivo nestes últimos tempos. Muito se ouve que há uma solução bastante eficaz para esta pausa e para a recuperação da matéria: “o que não se der agora, compensa-se para o ano”. Ora, há quem esteja no último ano de licenciatura, no 12º e, por isso, a terminar o secundário, ou mesmo no 9º, o último do ensino básico. Logo, esta é, sem dúvida, uma alternativa a excluir de imediato, pelo menos para alguns.

Voltando ao ensino superior, é importante referir que é este que antecede, ou é o que se espera, a ingressão no mercado de trabalho e que há que repensar numa alternativa que vá para além das ineficazes e infrutíferas aulas on-line, além de que, e sim, não se admirem, nem todos têm internet em casa, ou mesmo a suficiente para garantir uma fluência idêntica à presencial, ou mesmo um computador que suporte os meios necessários e exigidos.

O empenho com que muitos docentes têm tentado conduzir a aprendizagem, esforçando-se em assegurar a sua continuidade, numa fase crítica como esta, tem sido surpreendente, pela positiva. É certo que, na ocorrência de obstáculos, há que recorrer a outras formas e esta era, de certo, a alternativa mais viável, mas também é certo que a generalização que é feita constantemente é, no mínimo, absurda. Não se pode tratar de forma igual o que é diferente e isso é ponto assente.

Há cursos que envolvem componentes essencialmente teóricas e que podem, efetivamente, continuar a partir de casa. Por outro lado, há outros que são completamente inexequíveis e que merecem uma execução presencial. Medicina, Enfermagem, Teatro, Fotografia, Engenharia Eletrotécnica e de Computadores, Engenharia Mecânica, Ciências da Comunicação são apenas alguns dos casos. Por ser o meu e por ser um excelente exemplo da incapacidade deste “ensino” à distância, foquemo-nos neste último.

Como é que se estabelece uma ligação comunicacional de modo a obter uma perceção sobre determinado assunto ou acontecimento sem sair de casa, sem ir ao encontro de opiniões? Como é que é suposto realizar-se uma reportagem em vídeo, considerando todos os elementos que envolve, sobre algo atual e verídico, dentro de quatro paredes? Quem é que nos fornece o material e os meios necessários a uma realização minimamente digna de um conteúdo audiovisual e que permita ao aluno sentir-se realizado e confiante no momento da avaliação?

Estas são algumas das perguntas que o e-learning não consegue dar resposta.

Depois de expor todos os inconvenientes e alternativas que considero impensáveis, mas que são postas em cima da mesa pelo Ministério da Educação, não poderia terminar sem apresentar uma solução, a única solução justa, racional e merecida pelos quase 400 mil alunos matriculados no ensino superior: a prorrogação do segundo semestre. É inconcebível que esta hipótese de prolongamento das aulas pelo período das férias de verão não seja seriamente equacionada. Isto, se tudo voltar ao normal a tempo, óbvio. Se existem três intermináveis meses onde a ociosidade reina, então que sejam usados! Se essa pausa não existisse, aí sim, teríamos um problema, problema esse que se relaciona única e simplesmente com uma questão de tempo.

Neste momento, não é o cumprimento do calendário estipulado que se impõe, nem das desenfreadas aulas via Internet onde as falhas abundam e a comunicação escasseia.  Afinal, o que importa não é “despachar” este ano letivo e começar o próximo em setembro. O que importa é ter em consideração que tal atitude é um descomunal erro e refletir-se-á eterna e imutavelmente na vida de muitos estudantes e futuros profissionais.

Hugo Garrido