Uma grande parte de vocês ainda está a queimar a pestana durante a madrugada para exames. É incrível toda a matéria que se acumulou durante 4 meses e nós temos a proeza de a estudar toda em alguns dias. Esperem. Desculpem o exagero. Em algumas horas.
Sim, penso que parte disso é culpa nossa. A verdade é que adoramos procrastinar durante o semestre inteiro. Falo por mim, que encontro sempre algo mais importante para fazer do que organizar o estudo, afinal tenho tempo e surge alguma coisa que já devia estar feita para ontem. No entanto, este hábito de adiar para amanhã o que podemos fazer hoje não é apenas de nós alunos. Há muitos professores (no caso das avaliações contínuas) que só dizem em vésperas dos exames quem passa ou quem vai a exame, por isso também contribui para o facto de muitos de nós estarem a fazer diretas noite atrás de noite. E claro, ainda temos os amigos e família que também nos dizem “Anda lá só um bocadinho, não podes estar sempre com a cabeça nos livros.” que nos desencaminham para viver o presente, porque se a universidade fosse só estudar, não se dizia que é lá que conhecemos pessoas que são para a vida toda.
E andamos assim, nesta linha do tempo entre o semestre que fica para trás, mas para o qual ainda trabalhamos para não ir a recurso, e o novo, que estamos ansiosos que comece pois está cheio de promessas de que não vamos cometer os mesmos erros que cometemos nos semestres anteriores (são aquelas resoluções de Ano Novo que duram uma semana, se tanto).
É nesta altura de estudos intensivos e que exigem a nossa concentração máxima que damos por nós em devaneios sobre o nosso percurso de vida e as escolhas que fizemos para estarmos onde nos encontramos hoje e onde é que isso nos vai levar. Sentimos que estamos a dar tudo de nós e pensamos que vamos ser pioneiros e tirar o 16 no cadeirão do curso para provar às pessoas de que é possível tirar boas notas na faculdade. No entanto, quando sai a nota, vemos que as nossas horas “perdidas” resultaram num 13. É frustrante e sentimos que é aquilo que vai ditar o nosso futuro no mercado de trabalho porque, acabando a licenciatura, temos duas opções: continuamos a estudar ou vamos diretamente trabalhar e aplicar tudo aquilo que aprendemos, sentados na sala de aula e que nos deu um 17 através de um teste de escolha múltipla.
Contudo, isto não acontece apenas no sistema de ensino superior. Toda a nossa educação foi formada dentro destes moldes, em que testes teóricos ditam a nossa inteligência em termos quantitativos, desde a primária até ao fim da nossa formação educativa. Atualmente estão definidos 10 tipos de inteligência, com características e parâmetros díspares que os diferem. No entanto, o sistema escolar tem em conta apenas uma inteligência e molda seres humanos com base em critérios restritos e pouco pragmáticos, que cortam as asas à extrapolação da criatividade do indivíduo.
Perante a evolução dos tempos, das mentalidades, das tecnologias e da sociedade, o sistema de ensino é das poucas coisas que se manteve inalterada ao longo de todos estes anos. O chegar à sala, acomodarmo-nos nos nossos sítios e ouvir os professores a dar o programa não é algo que se enquadre neste século, não é forma de nos preparar para a profissão que vamos exercer durante o resto das nossas vidas.
Todos os dias nascem trabalhos que estão associados ao progresso e ao futuro, ao ser prático e desenrascado e saber fazer de tudo um pouco, mas o que sabemos nós que estamos nove anos sentados a ouvir e conciliar matérias de tudo e mais alguma coisa que pouco ou nada nos vão servir no futuro? Que sabemos nós que estamos mais três anos a estudar para uma área que não é bem a que nós queremos, mas é a que as escolas públicas nos impõem? Que havemos nós de fazer quando chegamos à altura que temos de optar por o que realmente queremos estudar, para construir a nossa carreira profissional, e ou não temos média suficiente, pois andamos a estudar algo que não era o que queríamos, ou então não temos bases para o nosso curso? Que havemos nós de fazer com licenciaturas que nos ensinam toda a teoria em três anos, mas que não têm incluídas um ano/semestre de estágio ou formação em contexto de trabalho? É uma bola de neve que só para de crescer quando estamos a exercer a nossa profissão e nos deparámos que não temos capacidades práticas que nos permitam desempenhá-la. Realmente foram 15 anos bem aproveitados e que nos prepararam para o futuro. O problema é que não foi é para o futuro deste século.
Duas pessoas não são iguais, porque é que o ensino pratica um sistema que coloca milhões de pessoas a estudarem para o serem? Todos nós temos diferentes pontos de vista, diferentes capacidades, diferentes necessidades, diferentes formas de aprender, diferentes sonhos que nos transforam num ser único e individual e que nos distinguem dos demais. O ensino não pode querer que saiamos da escola como modelos Ford T de cor preta. Por alguma razão se abandonou a estandardização há uns anos atrás.
Um número não é sinónimo de inteligência ou competência. O número de uma média (por si já é injusto arranjar um número de meio termo que quantifique as capacidades individuais e intelectuais) não deve servir para eleger de entre a lista de colocados em licenciaturas e mestrados quem entra ou não, nem para decidir quem tem mais aptidões para exercer determinado cargo profissional.
E no meio dos nossos devaneios, lembramo-nos que um sistema de ensino global não se muda de um dia para o outro e que no dia de hoje, ainda são os números que contam. Por agora vamos continuar a estudar e darmos o nosso melhor para o último esforço do semestre. Se não formos os percursores dos melhores resultados universitários, quem sabe se no futuro não sejamos pioneiros na reforma da educação.
Daniela Tomás