O álbum de estreia da banda americana foi lançado há 22 anos e foi batizado segundo a primeira música do disco, Is This It.
Após o sucesso do EP The Modern Age, lançado a 29 de janeiro de 2001, o grupo de Julian Casablancas, Albert Hammond Jr, Nick Valensi, Nikolai Fraiture e Fabrizio Moretti começou a ser considerado, no cenário americano e europeu, como o filho pródigo do rock da época e a prova de que o género estava longe de morrer.
Dava-se início à “caça aos The Strokes”. Depois de terem explodido no Reino Unido e na Austrália, com concertos esgotados, imensas editoras discográficas lutavam para ter a confiança e o trabalho do grupo. No entanto, a vencedora foi a RCA Records, que colocou a banda a trabalhar com Gordon Raphael.
Quase exatamente seis meses depois, a 30 de julho de 2001, foram comprovados os títulos atribuídos. O projeto continha três faixas que já haviam sido apresentadas no EP e 35 minutos e 48 segundos de um rock cru, no seu estado puro, e com todas as faculdades das bandas de garagem dos anos 70. Nascia, então, Is This It.
Este álbum de estreia foi lançado, primeiramente, na Austrália, resultado do sucesso que a banda conquistou no país oceânico. Ainda que novaiorquinos, o álbum só chegaria aos Estados Unidos da América a nove de outubro, após o ataque às torres gémeas no World Trade Center, e com algumas alterações. A faixa “New York City Cops”, que criticava os polícias da cidade de Nova Iorque, que, após o ataque de 11 de setembro, passaram a ser vistos como heróis, foi substituída por “When It Started”.
Constatável a “ouvido nu”, não se pode entrar neste planeta discográfico de The Strokes à espera de uma ode à musicalidade, repleta de criatividade e sonoridades inesperadas, numa viagem que culmina na visão sobre o Grand Canyon mascarada de punk rock. Até porque não é isso que a banda representa. O álbum é bastante simples, não busca invenções, não quer causar às pessoas dilemas insolussionáveis na sua compreensão – é direto, é cru, é forte, é rítmico e, acima de tudo, é muito bem feito.
A simplicidade, ainda que magnífica, do álbum confere-lhe o estatuto de um dos melhores álbuns de rock do início do século XXI. Não é por acaso que New Musical Express (NME) o coloca na primeira posição dos 100 melhores álbuns dos anos 2000.
O disco começa com uma bateria a acompanhar um riff de guitarra, parente daquele de “Where’s My Mind”, dos Pixies, que dá início à faixa que batizou o álbum. “Is This It” (a música) não procura fugir à linha que traça desde o início. É uma espécie de peça de tricô num álbum de rock n’ roll, que retrata a simplicidade e a normalidade de existirem discordâncias numa relação. Is This It? Claro que não, há muito mais!
Em seguida, numa composição já mais desafiadora, é-nos apresentada “The Modern Age”. Numa deambulação do ambiente urbano, digna de aplausos de Cesário Verde, Julian Casablancas canta-nos, num estilo subtil e rasgado dos anos 60 e 70, uma idealização de era moderna. Nick Valensi e Albert Hammond Jr encarregam-se de preencher o resto daquilo que é a estrutura primária da canção. As guitarras rasgadas, num riff staccato inicial e, mais à frente, num solo de Nick Valensi, são as principais componentes para a construção da segunda música do álbum.
“Soma” e “Barely Legal” são as duas faixas seguintes e, tendo em conta o conjunto do disco, são, juntamente com “New York City Cops”, as músicas que mais passam despercebidas no álbum, mediante a sonoridade de banda de garagem. (Nota do Autor: Ainda assim, “Barely Legal” é uma das minhas músicas favoritas dos Strokes)
“Someday”, “Alone, Together” e “Last Nite” representam o seguimento mais pop do álbum, sendo a primeira e a última os principais destaques deste trabalho.
Dona de um dos versos mais interessantes de todo o álbum (“Alone we stand, together we fall apart”), “Someday” combina o acompanhamento principal de guitarra com a bateria de Fabrizio Moretti e o baixo icónico de Nikolai Fraiture, que acaba por ter o seu momento a solo nesta música. A voz, já habitual, distorcida de Casablancas relata a dualidade do pensamento em decisões tomadas ao longo da vida do mesmo.
“Last Nite” é, para muitos, a melhor música do disco. Esta tira inspiração, assumidamente, do sucesso de 1977, “American Girl”, de Tom Petty and the Heartbreakers, e descreve um fim de uma relação. Aquela que, segundo o vocalista da banda, corresponde a uma viagem no tempo, para o futuro, de uma banda dos anos 70, relata um vínculo que terminou por aparente falta de interesse e empenho, o que leva o personagem desta história a ficar depressivo e a questionar as suas escolhas. “Last Nite” transpira a The Beatles, não só pela estrutura musical que apresenta, como pelas semelhanças no tratamento da voz de Casablancas ao de John Lennon, e pela guitarra de uma nota só, que cheira bastante a George Harrison.
Segue-se um surf em rock n’ roll de facto bastante afetado pelas ondas – não num mau sentido. “Hard to Explain”, “New York City Cops” (na versão original do álbum) e “Trying Your Luck” são um trio de músicas muito diferentes, de nuances que, ora pertencem ao ténue e leve, ora são explosivas e punk. Uma dinâmica interessante para um fim de álbum que se aproxima, de facto.
E chegamos. A música que encerra o álbum é “Take It Or Leave It” e, a este ponto, já seria bastante difícil alguém escolher “leave it”. A música retrata uma frustração entre as dinâmicas da sociedade para rapazes e raparigas. “And girls lie too much and boys act to tough! Enough is enough!”, é a punchline inicial deste som que demonstra, no fechar do álbum, o valor que a banda dá a uma boa guitarra, com ritmos focados em stroke down. Ao contrário dos outros solos, o de “Take It Or Leave It” é o que mais divide opiniões entre os fãs. É difícil gostar, o que não é necessariamente mau, mas um corta-sabores vir apenas para a última refeição geralmente não acontece.
Is This It fica marcado na história de rock como um dos melhores álbuns de estreia já vistos. As letras simples e geniais de Casablancas, que também pinta as músicas com a sua voz rouca e distorcida, aliadas à instrumentalização fantástica do disco torna-o num trabalho de rock extremamente bom. Não é estratosférico, nem messiânico, mas é um ótimo álbum para alguém que não busca uma criatividade excessiva e apenas quer ouvir bons sons. Bastou o primeiro álbum para colocar The Strokes na história do rock n’ roll e do punk.
Diogo Linhares
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