As cartas para um jovem poeta, ou seria mesmo as cartas para um jovem aprendiz? Poucas palavras para descrever e tanto para sentir. Um livro cheio de passagens sobre a vida, muito mais do que um manual de escrita, quase como um manual de como lidar com o nosso próprio “eu” criativo. Por vezes, a arte pode ser um campo difícil quanto à sua compreensão, mas Rainer Maria Rilke desmistifica as suas camadas com maestria. O que me faz pensar que às vezes a arte existe por si própria, a arte vive no criador, o autor fala justamente sobre a necessidade de escrever como sendo primordial para a existência. Se para existir preciso produzir arte, se para mim fazer arte significa sobreviver, eu sou um artista. A arte não precisa de aprovação externa porque a aprovação reside naquele que produz, ela tem vida própria e fala por si. A experiência de ler a obra do Rilke foi como aprofundar as várias camadas da vida, um conjunto de conceitos filosóficos que fogem do consumo instantâneo. Ler cartas a um jovem poeta é degustar cada palavra com afinco, é sentir cada frase, é abrir portas para uma viagem existencial.
O livro foi publicado no ano de 1929 e reúne dez cartas publicadas e enviadas ao longo de cinco anos por Rainer Maria Rilke a Franz Xaver Kappus, o aprendiz militar que ansiava ser poeta. Tópicos como autoconhecimento, solidão, tristeza, imediatismo e juventude permeiam nas cartas em forma de conselhos ao Kappus e ao próprio leitor, o Rilke é como um verdadeiro mestre. As cartas transmitem tal profundidade que, por momentos, questionamos tudo e todos. Buscar em nós próprios a resposta para tantas incógnitas torna-se difícil, e por esta razão, o livro é desafiador em todos os aspetos.
Dois temas que para mim despertaram significado foram a tristeza e solidão como forma de autoconhecimento e a paciência. Hoje em dia ser paciente requer muito da nossa energia, aproveitar o processo é a faísca para o que fazemos, quando vivemos sem pensar no resultado e a desfrutar a experiência por ela própria desfrutamos o todo. Quando a nossa atenção está voltada para a intensidade de sentir o momento, o resultado é mera consequência e para Rilke este é o maior defeito dos jovens. O imediatismo. Querem o agora como quem anseia um propósito.
Não podia deixar passar o tema solidão, o ato de introspeção para entender os nossos momentos de tristeza, descobrir os nossos limites e enfrentar as dificuldades. Estar só, é estar com os nossos pensamentos e se não formos capazes de lidar com eles de frente, quem será? É fundamental estar na nossa própria companhia para entender do que somos feitos. A tristeza e o amor são sentimentos tão difíceis, mas por serem difíceis valem a pena. O autor em várias passagens assenta a ideia do difícil ser positivo para a condição humana, e sinceramente, faz todo o sentido quando projetamos as nossas fases de maior crescimento. Como já dizia, há muito o que sentir sobre o livro, é uma jornada até o mais íntimo do poeta. É sensível, é comovente e através das palavras reconforta.
Giovanna Querubim