“Anora” e a ilusão do sonho americano

“Anora” e a ilusão do sonho americano

Vencedor da Palma de Ouro na edição de 2024 do Festival de Cinema de Cannes, esta comédia romântica da autoria de Sean Baker, conhecido pelo seu trabalho em “Projeto Flórida” (2017), apresenta uma odisseia da ilusão do sonho americano.

Anora (Mikey Madison) é uma jovem “stripper” cheia de sonhos que muda radicalmente de vida quando se casa com Ivan Zakharov (Mark Eydelshteyn), filho de uma poderosa família de oligarcas russos. Mas quando as notícias chegam aos ouvidos dos pais de Ivan, eles decidem viajar até Nova Iorque para por um ponto final naquele romance.

Apesar de ser classificado como uma comédia romântica, “Anora” (2024) tem um tom epopeico e trágico que se esconde num humor mais subtil e, por vezes, inusitado. A própria abertura do filme é um bom exemplo disso, definindo na perfeição a montanha-russa de emoções que o filme vai proporcionar ao expectador.       

            Quanto ao romance, a narrativa de Baker apresenta de forma explícita a relação intensa e, hipoteticamente, perfeita de Anora e Ivan na primeira metade do filme. A verdade é que esta é uma história de uma mulher que está à procura do seu lugar no mundo que, até se encontrar, recorre à validação dos outros acreditando que o seu corpo é a única coisa valiosa que tem para oferecer. E esta é a crítica social que suscita o humor subtil do argumento de Baker, sem nunca desrespeitar o trabalho das bailarinas exóticas – um tema que ainda é considerado um tabu no nosso quotidiano.

            Por outro lado, a história parece perdida no rumo que quer dar aos personagens e por isso empata-os em cenas que não agregam muito ao filme. Mas felizmente, isso não atrapalha a experiência o filme.

            A direção de Sean Baker parece simples, mas assim como o seu argumento, é complexa e subtil. Além de que, o seu estilo enquanto realizador homenageia os filmes de Tarantino, e isso fica nítido quando opta por apresentar emoções através de planos detalhe evitando, assim que o filme se torne demasiado expositivo.

No elenco o destaque vai para Mikey Madison, de “Gritos” (2022) e “Era Uma Vez em… Hollywood” (2019), no papel da complexa Anora, mostrando toda a sua versatilidade nesta atuação memorável. Já Mark Eydelshteyn dá vida a Ivan de forma infantil, não caindo no erro de se tornar um personagem caricato.

Com um elenco fora de série, subvertendo expectativas com um argumento inteligente – hilariante em certos pontos e dilacerante noutros – “Anora” (2024) de Sean Baker pode não ser uma comédia romântica tradicional, mas sabe como usar os clichês do género para tocar nos pontos sensíveis do expectador.

0-5: 4

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Texto: Ivo Pereira

Imagem: Universal Pictures