Ouro sobre Azul

Ouro sobre Azul

Quem sou eu além daquela que fui? Apenas sei que o mais próximo de mim sou eu. Eu que sou outono e ligeiramente primavera. Estações transitórias. Sei que sou algo não plausível, que espera o inesperado, com um humor instável, com alternância entre euforia e depressão, talvez ouro sobre azul. 

Na melodia das ondas, deixo-me levar, sinto a brisa, respiro o ar salgado e imagino que o mundo é somente meu. Os raios de sol são refletidos na minha pele, a brisa do mar torna o meu cabelo esvoaçante e no meu olhar, doce e sereno, sinto a inocência de alguém que não se preocupa com os terrores do mundo e que aproveita o que a mãe natureza tem para oferecer. 

Sobre mim, brilham as conchas que levo ao pescoço, que reluzem na minha pele e cuja beleza inconfundível não deixa ninguém indiferente. Será que esta é a minha casa? Será que é aqui o meu lar? Perguntas soltas e leves estão sempre pelo ar, como se fosse um labirinto sem saída. 

É inimaginável como existimos e como vemos todas as estrelas e cometas. Gosto de olhar pela janela, mas sempre com medo… Lá fora é tudo traiçoeiro. Sento-me, abraço os meus joelhos, sinto comichão pelo corpo – a respiração está ofegante – choro, começo a soluçar, um ciclo tão vicioso…, mas tão prazeroso. É mesmo aqui, aqui no canto que me vou transvertendo. De vez em quando, sabe bem chorar, ouvir a chuva de que não gostas, mas que no momento mais insano vai fazer com que mergulhes lentamente nos teus pensamentos. 

Odeio certas coisas obscuras!

Retomei os meus passeios solitários, ou na serra ou à beira-mar. Continuo a sentir-me perdida. Fico perene, com a alma leve, cheia de segredos incontáveis. Sinto-me mulher entre céu, terra, floresta e mar, que move e comove todos, que constrói ondas que mumificam numa fortaleza de energias. Sinto-me de todas as cores, de muitos amores, por vezes confusa de guerra e paz. No meio de rochas e água, de terra e sal, de folhas e lama, abraço o meu corpo de abrigo – choro – sou mulher de corpo curvilíneo de uma silhueta inconformável. Mulher das águas e folhas e dos mundos mais submersos. Sobre o mar azul, por entre os raios de sol. 

Já não passeio sozinha. Até pode parecer egoísmo ou vaidade, mas é fraternidade e valorização pela mulher que sou e que digo ser. Continuarei a chorar sem vergonha e afogar-me-ei nas minhas inquietações. Ninguém lembrar-se-á de mim!

É ouro sobre azul.

Beatriz Parada