Decorre a três e quatro de março, no Pequeno Auditório do Teatro Municipal de Vila Real, a peça encenada por David Carvalho que “conta a história de uma perda trágica de uma família aristocrática russa” a partir das 21h30.
Escrita por Anton Tchékhov em 1904, é a última obra do dramaturgo. Tendo a companhia já visitado o artista por duas vezes, em 1986 e em 2013, David Carvalho sente que “[é] vulgar vermos no nosso território solares e quintas em abandono que espelham um paralelismo com a vivência e o olhar de Tchékhov sobre a sociedade do seu tempo”, conta ao Notícias de Vila Real. Por esta razão, torna-se pertinente a visita a “dois mundos: a Rússia ainda feudal do século XIX e o fim pressentido desse mundo”, lê-se na sinopse.
A realização desta peça, a 83ª da Filandorra – Teatro do Nordeste, conta com as interpretações de Anita Pizarro, Bibiana Mota, Bruno Pizarro, Débora Ribeiro, Felícia Ribeiro, Helena Vital, Inês Medeiros, Luís Filipe, Paulo Magalhães, Rui Moura, Silvano Magalhães, Sinas Pereira e Victor Santos. Conta ainda com Pedro Pires Cabral, Carlos Carvalho e Pedro Carlos na equipa de suporte técnico e o apoio da DGArtes e a Câmara Municipal de Vila Real.
Dura cerca de duas horas e tem lotação limitada. Os bilhetes podem ser adquiridos no Teatro a quatro euros ou a três euros mediante a apresentação do Cartão do Teatro.
Estreia – três de março de 2023
Em resposta ao convite da Filandorra, O Torgador marcou presença na estreia. Questionados sobre o motivo da presença nesta peça, as respostas do público variaram entre a admiração por Anton Tchékhov, a familiaridade com um dos membros do grupo teatral e a “curiosidade”. Abriram-se as portas e o Pequeno Auditório encheu, notando-se a presença de diversos estudantes e antigos estudantes de Teatro e Artes Performativas (TAP).
A encenação de David Carvalho contou com atuações eletrizantes e bem conseguidas mas de escolas diferentes, com alguns atores inclinados para um maior teatralismo e outros um maior realismo. No entanto, as atuações de Débora Ribeiro (Vária), Silvano Magalhães (Lopákhin) e Paulo Magalhães (Firs) foram particularmente bem recebidas pelo público.
A história da peça, conta-nos Raquel Grilo, estudante de TAP que estudou a peça original, mantém-se praticamente igual. Aqui, aborda temas como a mudança social, a recusa em aceitar e agir conforme a realidade, a dependência em salvações externas e o intelectualismo impotente. Andréievna (Helena Vital Leitão) e Lopákhin, Iacha (Sinas Pereira) e Leonid (Victor Santos) apresentam dinâmicas representativas da queda da aristocracia e do surgimento da classe média, enquanto que personagens como Firs e Pischik (Márcio Bruno Pizarro) indicam como costumava ser a realidade da classe baixa e da classe aristocrática e como passara a ser.
A ação passa-se num palco simples, com duas localizações e uma projeção visual dinâmica de um cerejal. Verificou-se, no entanto, algumas dificuldades no suporte visual.
Não obstante, a atuação foi recebida com fortes aplausos e ovações em pé. David Carvalho tomou o palco juntamente com os atores e a Vereadora da Cultura Mara Minhava e referiu como Tchékhov “revolucionou o teatro”. Falou ainda das peças prévias do dramaturgo russo por parte da Filandorra, passando por atuações numa “sala de bombeiros” e num “solar” e dedicou a atuação da peça, russa de origem, à Ucrânia, motivado pela crença de que Tchékhov baseou O Cerejal nas estepes ucranianas. “Até daqui a 100 anos”, terminou.
Pós-atuação, o licenciado em TAP José Pimentel afirma ter gostado do “intermédio entre tragédia e comédia” e concorda que “o tempo passa mas esquecemo-nos na mesma das coisas”. Tanto ele como Raquel Grilo afirmam que, atualmente, se pede um teatro “mais natural e realista” nas atuações para atrair as gerações mais novas.
Do lado artístico, o ator Sinas Pereira, um dos licenciados em TAP na Filandorra, considera que a peça ganha maior interesse ao se considerar que foi originalmente escrita como comédia mas encenada como tragédia e agora “temos de a voltar a tornar numa comédia”. A atriz Débora Ribeiro considera ser um “prazer fazer esta Vária”, elogiando-a como uma “personagem dúbia” que faz o público refletir.
A peça, a última ainda sob o Programa de Apoio Sustentado, passará pelo Teatro Ribeiro Conceição, em Lamego, na próxima semana. Originalmente planeada para dezembro, a produção foi interrompida para que a Filandorra pudesse protestar a exclusão do Programa referido. Encontram-se atualmente com outras candidaturas em revisão para receber apoios culturais e em projetos que os levam a Vinhais, em Bragança, a Sátão, em Viseu e a diversas outras localidades.
Texto e Imagem: Joaquim Duarte