Portugal atravessa período de seca

Portugal atravessa período de seca

O ano de 2022 não começou propriamente bem para Portugal. Devido aos efeitos causados pelo aquecimento global, o país encontra-se num estado de seca extrema.

Segundo aos dados do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), relativos a 2022, desde o início do ano que todos os distritos do país se encontram em, pelo menos, seca fraca.

Janeiro 2022

Os dados relativos ao mês de janeiro são bastante claros, sendo possível verificar que apenas 0.6% do país se encontrava em seca fraca, 53.7% em seca moderada, 34.2% em seca severa e 11.5% em seca extrema.

Segundo o boletim climático de Portugal Continental, disponibilizado, também pelo IPMA, relativo ao mês de janeiro, este foi o 5º janeiro mais quente desde 2000, registando um valor médio da temperatura média do ar de 9,65°C. Além disso, foi o mês de janeiro com maior temperatura máxima do ar, dos últimos 90 anos, com um valor médio de 15.29 °C. Relacionado às temperaturas, foi o 6º janeiro mais seco desde 1931 e o 2º mais seco desde 2000. A ocorrência de precipitação só ocorreu nos primeiros 10 dias do mês, tendo sido muito pouco significativa.

Num panorama geral, em 75% do território os valores da quantidade geral de precipitação foram inferiores a 10mm. Como tal, isto causou a diminuição significativa dos valores de percentagem de água no solo em todo o território, salientando-se os valores inferiores a 20% na região Nordeste e na região Sul.

Fevereiro 2022

Fevereiro não foi diferente e a diminuição de dias não foi proporcional ao decréscimo da situação de seca do país. Neste mês, 4.5% do país esteve em seca moderada, 29.3% em seca severa e 66.2% em seca extrema.

Como é possível notar pelos relatórios do IPMA, apesar da seca ser notória em todas as partes do país, esta é mais intensa e de destaque nas zonas do interior, como Bragança, Viseu, Vila Real, Guarda, Castelo Branco e Beja; no litoral centro, como Lisboa, Leiria e Santarém; e no Sul, como Setúbal e Faro.

Este mês de fevereiro foi o 10º mais quente desde 1931 e o 5º mais quente desde 2000, com um valor médio de temperatura máxima do ar de 17.38 °C, a 2º mais alta desde 1931. Além disso, verificou ser o 3º mais seco dos últimos 90 anos, tendo chovido, de forma significativa, em apenas dois dias, 13 e 14.

Março 2022

No mês de março, classificado, pelo IPMA, como normal em relação à temperatura do ar e chuvoso em relação à precipitação, ajudou a atenuar o estado de Portugal. Com valores normais de temperatura média do ar e sendo o 6º mês de março mais chuvoso desde 2000, este mês foi bastante positivo, no que toca a combate ao estado de seca.

Ainda assim, o país mantém-se num estado de aridez bastante preocupante.

No terceiro mês do ano, 2% de Portugal encontrou-se em seca fraca, 82% em seca moderada e 16% em seca severa. É de destacar a situação no interior norte, em Bragança, e na margem sul, em Setúbal, na parte litoral de Beja e na parte mais a oeste de Faro.

Assim, num panorama geral, as temperaturas mais altas que o esperado e a baixa quantidade de precipitação têm afetado todos aqueles que dependem das condições meteorológicas para exercer o seu trabalho. Os agricultores, por sua vez, têm vivido e sentido na pele as consequências da seca que se vive em Portugal, receando que a situação piore com a aproximação do verão.

João Silva, agricultor nortenho, quando questionado sobre as dificuldades que a seca tem trazido para o seu trabalho, disse que esta implica que “as culturas que permanecem nos solos tenham de ser regadas por nós próprios”. Esta realidade faz com que haja “mais custos de energia” e, consequentemente, “maiores custos de produção”, sendo “obrigados a aumentar o preço ao consumidor final”. Acrescentou, ainda, que, no que diz respeito à pecuária e aos tratamentos dos animais, com as secas “não vamos produzir feno de boa qualidade”.

“O feno é a cultura que permanece no inverno e, como este tem sido seco, não vamos ter a quantidade, nem qualidade, suficiente para alimentar os animais. Além disso, isto afeta também as pastagens. Sem pastagens de boa qualidade, somos obrigados a trabalhar com rações, que estão cada vez mais caras devido à situação da guerra. Somos um dos maiores importadores de milho da Ucrânia. Isto aumenta logo os custos e somos obrigados a aumentar, também, o preço final.”

No que toca à confiança de uma possível melhora da situação, João Silva admitiu estar esperançoso quanto à mesma. “Como diz o velho ditado: “Em abril águas mil!”, mas abril já vai a meio e não falta muito para acabar. Acreditamos que em maio ainda virá alguma chuva, mas não vai ser suficiente para repor as reservas.”. Disse ainda que anseia um verão onde, “em vez de ter 2 meses seguidos sem chover”, haja alguns “dias de chuvinha, para ajudar”.

Referiu ainda que as ajudas são escassas e que “isto da seca não é levado muito a sério, mesmo implicando “demasiados custos na nossa produção”. “Se uma das nossas plantações morre, não recebemos ajudas por isso e a responsabilidade é totalmente nossa.”

A Associação dos Jovens Agricultores de Portugal (AJAP) foi fundada em 1983 e, como organização sem fins lucrativos, foi registada como ONGD em 1995. Nas palavras de Firmino Cordeiro, Diretor Geral da AJAP, “ao longo de 39 anos, muitos são os feitos, vitórias e acima de tudo a resiliência na luta pelas nossas causas.”. Acrescentou ainda que a AJAP tem fortalecido bastante o setor agrícola, ajudando no rejuvenescimento do mesmo e implantando novos modelos, mais organizados e que buscam uma melhora na produção.

“Somos uma organização reconhecida e creditada pelas instâncias governamentais em Portugal, através do CEJA – Conselho Europeu dos Jovens Agricultores, da qual somos membro na Europa, e um pouco por todo o Mundo.”.

Quando questionado sobre a situação de seca que se vive no interior, Firmino Cordeiro disse que estão “mais do que cientes”. Acrescentou: “Sabemos bem das diferenças entre as inúmeras realidades agrícolas do país. Somos sensíveis e promovemos a agricultura mais tecnológica, mais digital, mais inovadora e exportadora, quase sempre associada a culturas regadas, mas jamais deixaremos de alertar os diferentes responsáveis para a realidade de modelos de agricultura e culturas praticadas no interior, de norte e sul do país.”.

Mostrou-se ainda bastante preocupado com os agricultores regionais, admitindo que “A falta de água para as culturas […] deixa os agricultores destas regiões cada vez mais limitados em relação ao futuro.”. Admitiu, também, ser necessário mais “investigação em culturas de sequeiro” e “sistemas de regadio mais eficientes” e baratos. “Exige-se a adaptação e recuperação dos regadios existentes e a construção de alguns projetos que possam armazenar a quantidade de água suficiente.”.

Não se mostrando expectante quanto a uma melhora da situação num futuro recente, Firmino Cordeiro disse ainda que “a situação tende a agravar-se”. Numa procura de soluções a curto prazo, disse ser necessário “reter mais água das chuvas”, “utilizar formas de aproveitar a água do mar, dessalinizando-a” e existirem “seguros mais eficientes e que possam cobrir este tipo de adversidades.”.

Aquela que é a seca mais grave desde a de 2005 continua a afetar todo o território português e a assustar todos aqueles que dependem das condições climáticas para trabalhar. No entanto, segundo o IPMA, a situação só tende a agravar.

Diogo Linhares