Três pancadas secas. As luzes apagam-se. O público vai-se silenciando. O pano sobe. As luzes calorosas dos holofotes acendem. Começou o espetáculo. Cá atrás é a azáfama habitual: Atores correm para um lado, técnicos para o outro; uns vestem as suas roupas apressadamente, outros estão a rever o texto, antes de entrar em cena; alguém que não sabe do seu sapato e outra até que não sabe onde pousou os brincos; a encenadora que procura desesperadamente o ator principal… É o frenesim do teatro! E as saudades que eu tenho disto…
Entrar em cena é um misto de emoções. Estou quase a entrar… há borboletas na barriga. É a minha deixa. “Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo” … uma bênção divina nesta arte tão supersticiosa. Entro com o pé direito, não vá o diabo tecê-las. Naquele sítio, atrás do cenário, fico eu. Quem entra em cena não sou eu, é uma personagem, alguém com outra vida, outra história, outros medos. Por momentos esqueço os meus problemas, talvez até pela cegueira da intensa luz do holofote. Antes pudéssemos fazer tal coisa no nosso dia-a-dia… era tudo mais fácil. Lá em baixo há gargalhadas. Uma vénia, em forma de agradecimento, e uma ovação do público. É isto que o ator amador ganha. Somos pagos em aplausos e gargalhadas e não há maior felicidade do que saber que, por uma ou duas horas, fizemos com que aquelas pessoas se esquecessem de todas as suas tormentas.
Já não sinto estas emoções há muito. Mais sorte têm tido os fantasmas dos teatros. Afinal de contas são eles os donos de todas as salas de espetáculo. Com salas vazias há tanto tempo até eles, pobres coitados, já devem estar cansados e sem repertório para atuar. Ao menos não apanham estes Covid… pelo menos nunca disseram o contrário.
Deixo a minha solidariedade a todos os artistas. Espero que em breve as salas de espetáculos possam reabrir e assim podermos tirar o pó das tábuas e fazer o pano subir novamente. Afinal de contas, o palco não é para os fantasmas… Esses ficam nos sótãos…
Marcos Vilaça