A beleza do abismo

Acordo e sinto que estou a dar continuidade ao dia anterior. Quando abro os olhos, a madrugada parece-me tão escura como a noite e é essa a cor que perdura durante o dia.

Viver com ansiedade é viver numa espera constante pelo nada. É acordar todos os dias com o pressentimento de que alguma coisa má vai acontecer. Mas nada acontece e o sentimento vai acumulando. Passam dias, semanas, meses e aquela má sensação continua lá.

À noite, a cama transforma-se num palco de conflitos. Longe dos olhares, dou finalmente liberdade aos meus pensamentos. Procuro sentir realmente alguma coisa. O único desejo é que este sufoco se torne físico, seria muito mais fácil de suportar. O normal seria sentir tristeza, mas, em vez disso, só há um vazio. Envolta em mim mesma, deixo-me adormecer.

Um dia novo, o mesmo nervosismo. Aulas, trabalhos, praxe, horários que precisam de ser cumpridos e a ansiedade que insiste em estender-me a mão. Eu recuo vezes sem conta. A minha luta pelo equilíbrio é constante, mas não é uma coisa que consiga controlar por completo. E quando chego ao limite começa tudo de novo: a falta de ar, o choro descontrolado, as mãos trémulas, o aperto no peito.

Os ataques em si são a parte mais fácil de lidar. Sentar, adotar a posição correta, controlar a respiração, ficar calma. Podia muito bem ser só esse o momento de ansiedade. Já preparada para passar pela situação, estes episódios seriam bem mais efémeros. Mas infelizmente, ter ansiedade é mais complexo que isso. Por vezes, nem chego ao ponto da crise. O coração acelera, sinto-me a ficar sem ar e, de repente, já passou. A respiração volta ao normal e os batimentos voltam ao seu ritmo. Então fica o medo. O medo de não conseguir ter rédeas em ti mesma. Mas se eu própria não tentar combater a ânsia, ninguém o fará por mim.

Penso na quantidade de pessoas que estarão a passar pelo mesmo, a sentir o mesmo que eu e, que mesmo assim, não se deixam intimidar. Todos os dias morrem pessoas em silêncio. Pessoas estas que se deixam consumir pelos problemas, por doenças, pela sociedade. Tornam-se demasiado invisíveis aos olhos de quem as rodeia. E eu não. Eu tenho a sorte de ter perto de mim pessoas que procuram ajudar-me. Certificam-se de que a solidão fica longe de mim e que estou bem.

Prefiro pensar como eles: estou numa fase que rapidamente passará. E é esse que deve ser o meu pensamento. Até que a ansiedade decida procurar outra mente.

Alexandra Fonseca