De acordo com um artigo do jornal O Público, os alunos do ensino profissional vão ter uma via própria de acesso ao ensino superior. Um projeto que entra em vigor a partir do próximo ano letivo e que já começa a ser alvo de várias críticas. Há quem concorde, há quem afirme que é injusto. Eu acho que é uma questão sintomática de governos em ano eleitoral. Mas uma coisa acho que é unânime, na educação tudo é melhor que o computador Magalhães. Se ao invés deste “projeto-piloto”, como gosta de chamar o ministro do ensino superior, Manuel Heitor, dissessem que todos os alunos, sejam eles do ensino regular ou profissional, para entrar no ensino superior tinham que se sujeitar à ingestão de meio quilo de alcatrão ao mesmo tempo que assistiam ao programa “Quem Quer Casar com o Agricultor”, tudo isso de cócoras, ainda assim seria mais entusiasmante do que um computador com nome de navegador e de gajo que perde a virgindade aos quarenta com um rabanete.
Compreende-se a preocupação do governo, dos rankings e do próprio ego do país, mas querer licenciaturas em catadupa não olhando a meios também não é assim muito agradável. Há que ter alento, e não falhar com a justiça. Claramente, os alunos do ensino regular olhando para esta situação mostrar-se-ão desagradados, e é compreensível. Ninguém leva de boa vontade o facto de não ser obrigatório ler Os Mais ou passar dois períodos à espera do S. Sebastião e mesmo assim obter o mesmo fim.
Quem escolhe a via do ensino profissional, primeiramente, tem como objetivo, após o fim do curso, ter as competências necessárias para entrar no mercado de trabalho. Estarão, portanto, mais capacitados em comparação com os do ensino regular. Mas isso não exclui a hipótese de, no final do curso, mudarem de ideias e acharem mais adequado seguir a via académica. Para isso sujeitar-se-ão às regras do ensino regular e candidatar-se-ão ao ensino superior através de exames. É evidente que estamos em constante mutação, logo as escolhas que fizemos no passado, podem não ser as mesmas das de hoje. Eu, antes, por exemplo, escolhi dar oportunidade às pessoas quando falavam comigo, agora conto até cem na negativa ou cuspo-lhes na cara. Por sua vez, quem opta pelo ensino regular planeia, à partida, a continuação pela via académica. É assim a ordem natural das coisas.
João Sobrinho Teixeira, Secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, disse em tom de pergunta retórica, numa entrevista ao site Uniarea, que “seria justo que estes jovens fizessem exames nacionais, nunca tendo aprendido determinados conteúdos? Penso que, com esta pergunta, respondi à questão.” Lendo assim, até parece que acabou de conseguir fazer cem flexões com a testa, o campeão. Expliquemos ao Sobrinho que estes jovens não aprendem determinados conteúdos para fazerem os exames nacionais porque escolheram um caminho diferente, optaram pelo profissional. Assim como quem decide abandonar a escola depois do 9ºano não tem qualquer preparação para elaborar um mestrado. Nem quem ingressa no Chapitô tem qualquer habilitação para seguir engenharia aeroespacial. Faz tudo parte de escolhas. Cesare Pavese, no seu livro “Ofício de Viver” – que já agora aconselho a lerem – disse relativamente ao prazer das escolhas que fazemos, que temos de renunciar a muitas coisas para termos uma só, consequentemente, não poderemos ter duas coisas ao mesmo tempo. Agora pratiquem, vá.
Antes de começarem a dizer que eu não sei o quê e tal, eu já frequentei ambos os casos – ensino regular e profissional – e até fui mais longe, acabei o 12º ano num curso para adultos à noite onde as disciplinas, imaginem só, eram relacionadas com eletrodomésticos e betoneiras. Vocês não queriam certamente aquilo para a vossa vida. Nem eu. Por isso passei um ano a estudar para os exames, que os alunos do ensino regular têm de se submeter, enquanto intercalava os estudos com “Tem cartão Poupa Mais? Vai desejar saco?”, porque não sou mais especial do que os outros, sou apenas mais bonito e tenho um cérebro de Bukowski sóbrio, o que nada tem a ver com esta história. Por fim, candidatei-me e entrei. Se sou o maior por isto? Epá, sou. Julguem-me.
Herman José