No passado dia 11, Jorge Pinto, apoiado pelo Livre, e André Ventura, apoiado pelo Chega, encontraram-se num frente-a-frente televisivo no âmbito da corrida às presidenciais de janeiro. O debate ficou marcado pela divergência em torno das políticas laborais, por visões opostas sobre o papel do Presidente da República e por abordagens distintas à estratégia económica do país.
O arranque do debate foi dominado pela greve geral e pela proposta de alteração à legislação laboral. André Ventura foi confrontado com a mudança recente de posição sobre o tema, depois de anos a criticar este tipo de protesto e de se mostrar agora solidário com a greve. O candidato respondeu afirmando que sempre alertou o Governo para o risco de contestação social e classificou a proposta laboral como “uma burrice”. Aproveitou ainda para criticar o que considera ser um duplo critério mediático, alegando que manifestações associadas ao Chega seriam alvo de maior escrutínio judicial.
Jorge Pinto apontou essa mudança de discurso como sinal de incoerência e classificou a proposta do Governo como “um ataque aos direitos dos trabalhadores como não se via há muitos anos”. Criticou o Executivo por manter a iniciativa apesar da contestação nas ruas e alertou para o agravamento da precariedade laboral, sublinhando possíveis retrocessos nos direitos de pais e mães trabalhadores e riscos de aprofundamento das desigualdades salariais entre homens e mulheres.
A discussão sobre o papel do Presidente da República evidenciou leituras opostas da função. Jorge Pinto atacou a imagem de André Ventura enquanto figura “anti-sistema”, descrevendo-o como alguém profundamente integrado no próprio sistema que critica, apontando a sua presença constante nos meios de comunicação social e caracterizando-o como “o queridinho do sistema”. O candidato do Livre afirmou orgulhar-se do regime democrático atual e disse candidatar-se para “mobilizar a cidadania” e aproximar a política das pessoas. André Ventura reiterou que não quer ser um Presidente “decorativo” e defendeu um exercício mais interventivo do cargo, questionando a eficácia do atual modelo institucional, sobretudo no que toca a nomeações para cargos de topo da justiça, afirmando que “o sistema não está a funcionar bem”.
O momento mais tenso do debate surgiu quando Jorge Pinto abordou a relação de André Ventura com o país real, defendendo que a principal diferença entre ambos reside na forma como olham para Portugal. Acusou o líder do Chega de viver afastado da realidade quotidiana dos portugueses e de só contactar com o país em contextos altamente protegidos. Ventura respondeu rejeitando essa imagem, lembrando as suas origens fora dos grandes centros e afirmando que “ama os portugueses como ninguém”. Referiu ainda as ameaças de morte e de bomba que diz ter recebido, justificando a necessidade de segurança permanente e acusando o adversário de desconhecer essa realidade.
No último tema do debate, centrado na economia e no desenvolvimento do país, as diferenças voltaram a ser claras. Jorge Pinto defendeu um modelo assente no reforço do Estado social, na proteção dos serviços públicos e numa economia que coloque o trabalho e a sustentabilidade no centro das decisões políticas. André Ventura contrapôs com uma visão mais crítica do peso do Estado, defendendo reformas profundas, redução da carga fiscal e um combate mais duro ao que considera desperdício e má gestão dos recursos públicos, afirmando que sem crescimento económico “não há justiça social possível”.
Já perto do final, Jorge Pinto anunciou que reuniu as 7.500 assinaturas necessárias para formalizar a candidatura, que serão entregues no próximo dia 17 de dezembro, e revelou que terá como mandatária Leonor Caldeira, jovem advogada distinguida com o Prémio Nelson Mandela.
O debate terminou sem consensos, mas com linhas claras de separação entre dois projetos políticos que representam visões opostas sobre o papel do Estado, da Presidência da República e do futuro do país.
David Silveira