O Sporting venceu na Madeira por 1-4, frente ao Nacional, em jogo da terceira jornada da Liga Portugal. Apesar de ter começado a perder logo aos três minutos, a equipa de Rui Borges deu a volta na segunda parte, com Pedro Gonçalves em destaque absoluto ao assinar um hat-trick e ainda uma assistência para Conrad Harder.
Ora, a verdade é que, llogo ao terceiro minuto, o silêncio caiu sobre os visitantes. Léo Santos, a saltar mais alto do que todos, aproveitou a precisão de Liziero num canto e cabeceou para o fundo da baliza. Rui Silva ainda roçou a bola, mas ficou mal na fotografia: entrada em falso do guardião, que ofereceu ao Nacional um balão de oxigénio precioso.
O golo não só deu vantagem ao conjunto insular, como empurrou a equipa de Tiago Margarido ainda mais para dentro do seu bloco baixo — um 5-2-3 compacto, coeso, que asfixiava o jogo interior do Sporting e obrigava os leões a insistir pelos corredores.
Com Fresneda e Geny Catamo discretos na direita, a responsabilidade ofensiva recaía sobre o flanco esquerdo, onde Ricardo Mangas e Pote procuravam abrir brechas. Rui Borges bem pedia circulação rápida e mobilidade, mas a agressividade dos madeirenses nos duelos não permitia clareza.
Ainda assim, oportunidades não faltaram: Suárez, feroz a atacar a profundidade nos três corredores, criou lances de perigo; Trincão apareceu solto na área; Pote disparou à trave. A eficácia, porém, tinha ficado esquecida no balneário.
O jogo endurecia, como Margarido tinha planeado. Era essa a grande arma do Nacional: o choque, a intensidade, a forma como fechava todos os caminhos centrais. A missão tornou-se ainda mais difícil para os da casa quando Pablo Ruan viu o segundo amarelo aos 37’.
Mas, paradoxalmente, essa expulsão trouxe-lhes novo foco: recuaram ainda mais, transformando o desafio leonino numa prova de paciência contra um muro quase intransponível. Ao intervalo, os insulares venciam e até podiam ter aumentado a vantagem num cabeceamento de Matheus Dias após livre lateral.
Rui Borges não escondeu a urgência de mudar o rumo dos acontecimentos. A equipa regressou mais vertical, com ordens claras: maior presença no corredor central, mesmo contra o bloco baixo, aproveitando os passes de Gonçalo Inácio, que massacrou a linha defensiva madeirense com a precisão do seu pé esquerdo. E foi precisamente daí que nasceu o primeiro momento-chave.
Aos 52 minutos, Trincão reagiu bem à perda, recuperou, lançou Geny, que abriu em Fresneda. O espanhol entrou por dentro — como o treinador lhe havia pedido —, soltou para Suárez e o colombiano, com um toque de calcanhar sublime, deixou Pote na cara do golo. Remate seco, colocado. O empate chegava num instante em que era fundamental marcar cedo para aproveitar a superioridade numérica.
O Sporting respirava melhor, mas não sem nervos. A pressa em decidir e a ansiedade nos últimos metros traziam decisões precipitadas. Rui Borges mexeu, lançou Vagiannidis e Quenda, este último algo fora de si, sem a confiança necessária para desequilibrar. O grego, pelo contrário, deixou a sua marca: túnel brilhante, corrida pela direita e assistência para Suárez finalizar. Mas o VAR anulou o tento por fora de jogo. A sensação era de que a avalanche estava a formar-se, apenas à espera do momento certo para atacar em força.
E esse momento chegou ao minuto 76. Gonçalo Inácio rasgou o bloco com um passe vertical, Pote recebeu orientado, fletiu da esquerda para dentro e disparou rasteiro, junto ao poste. Remate que mais parecia um passe para a baliza, uma assinatura do camisola 8. O Sporting virava o jogo e, dessa vez, a resistência insular soçobrava.
Tiago Margarido ainda procurou refrescar o setor ofensivo. Lucas João, lançado para explorar as bolas paradas, teve na cabeça o 2-2, mas desperdiçou. E como o futebol raramente perdoa, na jogada seguinte o Sporting matou a partida: Quenda iniciou pela esquerda, Pote temporizou e cruzou para Harder, que se estreou a marcar na época com um desvio certeiro aos 83’. O dinamarquês celebrou com veemência, batendo no símbolo do leão, talvez também em resposta aos rumores de saída.
Já em tempo de compensação, Pote coroou a exibição. De novo pela esquerda, voltou a arrastar para o meio e rematou de fora da área, com a calma dos predestinados. O hat-trick estava feito, a Choupana rendida à mestria de um jogador que, ainda há pouco tempo, parecia debilitado por uma escorregadela que quase o tirava da partida.
De facto, a vitória por 1-4 pode sugerir facilidade, mas foi tudo menos isso. O Sporting teve de lutar contra um adversário bem preparado, com um treinador que, mais uma vez, provou a sua competência apesar dos recursos limitados. Tiago Margarido montou uma equipa que anulou o jogo interior leonino durante largos minutos, recorrendo a uma agressividade sem bola que retirava conforto aos criativos de Rui Borges.
Deste modo, do lado leonino, houve nomes a merecer destaque além de Pote. Luís Suárez mostrou-se inteligente, móvel, a arrastar defesas e a abrir espaços — um avançado completo. Gonçalo Inácio foi uma seta apontada ao coração do bloco, ligando o jogo com passes verticais. Kochorashvili, lançado ainda na primeira parte, trouxe músculo e clarividência à circulação, mostrando que pode ser opção séria para o Clássico frente ao FC Porto. E Ricardo Mangas, discreto na manchete, mas consistente na definição ofensiva pela esquerda, foi mais uma das engrenagens que ajudaram a desmontar a muralha insular.
Houve também as notas menos positivas: a fragilidade de Fresneda no último terço, a incapacidade de Geny em assumir protagonismo, a ansiedade que toldou o discernimento coletivo em certos períodos. Mas o diagnóstico final foi favorável: apesar da tosse seca nos passes e da dor de cabeça perante o bloco baixo, o Sporting acabou por encontrar o antídoto.
Posto isto, mais do que três pontos, esta vitória representa um teste superado antes do primeiro Clássico da época. O Sporting chega à receção ao FC Porto com nove pontos em nove possíveis, confiança reforçada e um Pote rejuvenescido, capaz de transformar dificuldades em arte.
Assim, na Madeira, o leão sofreu, desesperou, sentiu-se encurralado, mas soube reagir. Foi um jogo de paciência, inteligência e talento individual. Um jogo em que se percebeu que, mesmo quando a eficácia se esconde, mesmo quando o adversário fecha todas as portas, há sempre uma janela que se abre.
E nessa janela estava Pedro Gonçalves, a desenhar com o pé direito o guião perfeito para mais um final de tardeinesquecível de futebol.

Três golos e uma assistência. Pote assinou uma exibição de luxo, daquelas que ficam gravadas na memória dos adeptos. Foi decisivo a encontrar os espaços que o Nacional tentou fechar, letal na finalização e, ainda assim, solidário no jogo coletivo ao assistir Harder. Uma tarde inesquecível. Aos 22 minutos, porém, esteve perto de sair de cena: depois de já ter atirado à trave aos 11’, escorregou e torceu o pé esquerdo, levantando dúvidas sobre a sua continuidade. Voltou pouco depois, com dores visíveis e o pé ligado, mas determinado. Ainda ameaçou num remate ao lado aos 34’ e viu Matheus Dias negar-lhe o golo em cima da linha nos descontos da primeira parte. No entanto, na segunda parte não houve contenção possível: três remates, três golos — o primeiro dentro da área, os outros dois em diagonais da esquerda para o centro, já à entrada da zona de tiro, indefensáveis. Pelo meio, ainda serviu Harder com precisão milimétrica. Uma demonstração de classe que virou o jogo e confirmou quem é o verdadeiro protagonista deste Sporting.
Texto: Raúl Saraiva
Imagens: @SportingCP