“Dançar é como sonhar com os pés”, era o que estava escrito na parede da minha antiga escola de dança. Achei, durante muito tempo, que era imperativo que dançar fosse mesmo sonhar com os pés, mas houve um ponto na minha vida onde a dança deixou de ser assim.
A dança deixou de ser sonhar com os pés para passar a ser respirar com a música. Dançar é viver, sentir, interpretar, exalar, sonhar, expressar, desejar, existir com cada pedaço do nosso corpo. É pôr cada sensação no mais pequeno movimento. É dizer em cada olhar a história que queremos contar. É descrever alguém em cada passo. É movimentar cada músculo com a certeza de movimentar o músculo seguinte. Não é seguir apenas uma sequência, mas colocar em cada parte um pedaço da nossa própria alma. Deixar transparecer um bocado da nossa própria vida a cada batida e misturar as batidas da música com as dos nossos corações.
A dança representa algo para além de nós mesmos, para além da nossa existência ou vivência. É sentir a dor do outro, a felicidade de uma criança ou o cansaço de um idoso. É pôr no corpo o que nos vai na alma, deixar a música guiar o que nos entra na cabeça e dançar em grupo é fazer parte de uma família, de algo grande mesmo que num palco pequeno.
Dançar, por si só, vai além de sonhar. Entra pelos ossos e permanece nos átomos.
A linha ténue que separa um desporto de um estilo de vida, que deixa de ser uma obrigação e passa a ser uma necessidade, assim como o ar está para os pulmões.
A necessidade de sentir o prazer de uma coreografia bem executada, de olhar para as pisaduras e saber que agora faço aquele passo e saber que consegui fazer aquela coreografia toda que era tão difícil de completar.
Esta arte é ter a certeza que no dia seguinte vou voltar a repetir o que fiz hoje e a repetir com o mesmo entusiasmo na tentativa de acertar cada tempo e ter a certeza que, mesmo quando erro, volto a tentar até aperfeiçoar cada linha.
Cada dor é uma conquista e cada hematoma é um troféu, mesmo sabendo que vai custar e que a satisfação vai ultrapassa a dor. Dançar não é só sonhar com os pés e muito menos é só um desporto. Dançar é tão natural como o sangue que corre nas veias e é tão necessário como respirar, tornando-se um escape da realidade.
Dançar é o que eu sou!
Verónica Amado