O Sol embate sobre um copo de plástico abandonado na calçada. Meio cheio ou meio vazio? Não importa. A verdadeira questão é: com o quê? Duas beatas e um líquido ambíguo de tom amarelo que esperemos, na melhor das possibilidades, se trate de cerveja. Assim começa o dia no Largo do Pioledo.
Os comerciantes abrem as lojas e as cadeiras dos cafés dão agora a vez a caras enrugadas, que comunicam entre elas e degustam o seu café matinal. Um dia seremos assim, talvez não aqui, mas em qualquer outro lugar.
Se a estátua que olha diretamente para este largo pudesse mexer a sua boca, e contar tudo o que os seus olhos imóveis viram, que estórias contaria ela? Infelizmente, nunca saberemos, mas ela ali fica, atenta, a contemplar tudo o que acontece na sua perpétua mudez.
O Pioledo nunca dorme… nem deixa dormir. Gritos de euforia e os ocasionais insultos e provocações de pré-porrada são a trilha sonora que ecoa pelo Largo e anima as suas noites, desanimando quem nele habita.
Por contraste, o silêncio marcaria as manhãs no Pioledo, se não fosse pelo barulho das crianças que brincam alegremente no recreio da escola e pelo motor do ocasional carro que passa.
O Largo do Pioledo é assim, durante a manhã, um velhinho que se cobre com um manto de plástico, vidro e vómito e que nele tenta fazer a sua sesta. Um olho aberto e outro fechado. Coitado do senhor, nunca tem sossego.
Hélder Silva