“Mãe, sou gay e agora?”

A Terceira Marcha pelos Direitos LGBT, realizou-se no último fim-de-semana em Vila Real. Novamente, esta cidade viu as suas ruas coloridas, de mensagens de amor e sobretudo igualdade… a igualdade de amar, a liberdade de amar! Se ainda continua a fazer sentido este tipo de manifestações de rua? Mais do que deveria ser preciso. Lutar pela igualdade, vai sempre fazer sentido! E mesmo quando pensámos que começamos a viver num mundo com mais consciência, somos confrontados com situações que nos roubam a esperança… a esperança de que algum dia, seremos todos livres de amar.

Com isto quero dizer que, ainda há poucos dias fui abordada por uma situação que me deixou, mais uma vez (infelizmente!), furiosa com a nossa sociedade! Interrogo-me quando é que saberemos traçar a linha que separa o estúpido do normal!?

A situação, engloba uma prima minha, que é professora e diretora de turma, e teve um pedido especial de um dos seus alunos, com o qual também não sabia lidar… digamos que, um pedido de ajuda! Queria que falasse com a sua mãe acerca da homossexualidade, pois ele fizera-o e a primeira abordagem não correu bem, assim como as primeiras reações. E esta situação, já passei mais vezes com amigos, conhecidos e até estranhos, que contaram aos pais acerca da sua sexualidade e as reações não foram as desejadas! Foram julgados e entendidos como doentes, loucos.

O que me levou a pensar: e se fosse eu? Como explicaria a minha mãe, que o amor não tem género?

“Mãe,

Hoje gostaria de falar contigo sobre algo que já não aguento guardar para mim. Sou teu filho e sempre me juraste amar independe mente de tudo, e espero que tenhas esse juramento hoje em conta. Sei que provavelmente não vai ser fácil para ti, não vais entender e muitas questões irão surgir na tua cabeça, mas viver nesta ilusão, nesta mentira, não me deixa feliz! Não me faz querer viver! Porque não há nada mais cruel do que fingir ser uma pessoa que não és!

Antes que digas alguma coisa, peço-te que me ouças até ao fim, peço que tentes compreender aquilo que te quero dizer e que todos os teus julgamentos ou dúvidas, serão esclarecidos. Eu prometo mãe!

Com a vida aprendi que, amar é dos mais puros sentimentos que uma alma impiedosa como a nossa, por vezes, não deveria merecer sentir. Julgamos o que não sabemos. Condenamos o que não é nosso!

Vivemos num mundo onde a maioria das pessoas não entende, ou simplesmente, não quer entender, que não escolhemos de quem gostamos, de quem amamos ou com quem queremos passar o resto da nossa vida. O único responsável por essa decisão é um músculo com cerca de doze centímetros de comprimento e 9 centímetros de largura – o nosso coração.

Mas se ainda não entendes o que quero dizer mãe, vou tentar simplificar. Quando eras mais nova, alguma vez na tua vida tiveste algum amor que não foi correspondido ou que tu mesma não correspondeste a outra pessoa, certo? Sabes porquê?

Porque não escolhemos de quem gostamos! Mais que eu, tu sabes mãe, que quando é amor, ele acontece de forma natural, não é forçado. Nem teria piada se assim o fosse, concordo. Eu já tentei gostar de várias pessoas, tentei ser outra pessoa!

A verdade é que, não escolhes uma pessoa na tua lista de contactos e começas a gostar dela, só porque assim o decidiste. Não sentes um nervosismo nos primeiros encontros, nem arrepios na pele quando beijas a pessoa, ou um brilho nos olhos quando a vês e um sorriso quando pensas nela durante o dia, se realmente não for um amor escolhido pelo coração! E isso tu não controlas, é apenas ele – o responsável por bombear o sangue por todo o teu corpo, decide também a pessoa com a qual vais querer passar o resto da tua vida… somos seres tão especiais, e incrível como nem a isso, damos o devido valor!

E já me interroguei várias vezes mãe:” Não seria mais fácil viver num mundo, onde pudéssemos escolher de quem gostamos? Se calhar não estaríamos a ter esta conversa agora! Mas que piada isso teria? Onde estaria toda a magia, o romance e aventura de viver um grande amor? Estarias tu com o pai neste momento? Terias construído a nossa família e serias tão feliz se fosses tu a decidir e não o teu coração?

Porque é disso que se trata, de felicidade. E mais que tudo, eu quero ser feliz mãe. Quero ter a liberdade de amar quem eu quiser. Seja homem, seja mulher. Seja branco, seja negro. Seja católico, seja muçulmano. Seja quem for, quero ter a liberdade de o puder amar e não ser julgado por isso! Não ser discriminado por isso! Não ser alvo de piadas e comentários homofóbicos!

E não é isso que tu queres para mim… felicidade?

E como já deves ter percebido mãe, a verdade é que sou gay! Não posso, não consigo e acima de tudo, não quero mais esconder a minha sexualidade. Não é justo para mim, ter que ser infeliz, só porque a sociedade ainda acredita que ser heterossexual é que é normal! A vida é minha, o corpo é meu, o coração é meu… e ele é que decide!

Espero que compreendas que o teu filho é o mesmo. Espero que não rezes à noite a pedir que isto passe, ou que penses que erraste por algum momento na minha educação e me fizeste assim. Tu não o escolhes, eu não o escolhi!

 E além disto, peço-te do fundo do meu coração, que faças o máximo de esforço para que entendas que isto é ser normal, amar alguém, independentemente do seu género também é amor … e acredita que, não se trata de nenhuma doença, porque se realmente eu estou doente … tu estiveste doente uma vida inteira, por amares o pai.

E o amor não é uma doença … é uma dádiva!”

Seria assim, acima de tudo explicar que, é realmente uma dádiva o amor.

É a maior das felicidades: amar, e ser amado.

Vera Silva