A maldição de Béla Guttmann: A grande desculpa para a derrota

A maldição de Béla Guttmann: A grande desculpa para a derrota


Os anos 60 foram uma época gloriosa para o Sport Lisboa e Benfica. Década esta que valeu, ao clube, duas Taças da Liga dos Campeões, à data treinado por Béla Guttmann. Deste modo o treinador húngaro ganhou imenso prestígio e acabou por exigir uma recompensa pelo bicampeonato europeu conquistado, recompensa esta que lhe tinha sido prometida pela direção encarnada antes mesmo das competições serem disputadas. Para além desta recompensa, Guttmann mostrou um grande interesse em renovar com o clube de Lisboa. No entanto, o presidente Maurício Vieira Pinto não devolveu esse interesse e negou-se a renovar o contrato e a pagar a recompensa, pois o clube não tinha capacidade financeira para o fazer. Neste sentido, a saída de Béla Guttmann do Benfica foi muito conturbada. Conturbada de tal maneira que, supostamente, Béla Guttmann rugou uma praga ao clube, afirmando que o clube vermelho e branco não voltaria a ganhar uma competição europeia “em cem anos”. Mas até que ponto esta maldição é uma realidade? Será que esta maldição não serviu apenas de bengala emocional para justificar as derrotas europeias?

É facto que depois da saída de Guttmann o Benfica perdeu todas as finais europeias a que chegou: cinco finais da Liga dos Campeões e três da Liga Europa. Mas no meu ponto de vista estas derrotas nada têm a ver com a suposta maldição.

Na maioria das finais, o Benfica disputou os títulos com clubes muito fortes e com grande puder económico e estrutural. Puder este que comparado ao clube encarnado era muito superior. Neste sentido, penso que esta maldição acabou por funcionar como algo que explica o inexplicável. Penso que isto se aplica mais à necessidade humana de encontrar sentido nas derrotas do que a qualquer poder místico. E atribuir os insucessos à maldição é ignorar a realidade competitiva do futebol, que é um jogo incerto e muito surpreendente. Para além disso, o próprio Béla Guttmann chegou a desmentir o mito em algumas entrevistas para os jornais A Bola e Record em que o treinador húngaro afirmou que o Benfica estava num bom caminho e que, mesmo sem ele, voltaria a ganhar a nível internacional. Para reforçar esta ideia, António Simões desmentiu o boato, numa participação no podcast 90+3 da RFM, afirmando que o treinador “nunca disse isso”.

No entanto, não nego por completo o impacto que este mito causou no clube e nos seus associados. Os adeptos acreditaram mesmo no boato e carregaram o peso simbólico do mesmo até aos dias de hoje. A pressão psicológica que esta mentira causou nos jogadores e dirigentes do clube foi tão grande que, mais de vinte anos depois, Eusébio da Silva Ferreira chegou a visitar a campa de Béla Guttmann para lhe pedir perdão e ajuda para a final da Liga dos Campeões (1989/90), que o Benfica viria a disputar com o AC Milan.

Concluo assim que a Maldição de “Béla Guttmann” não passou de um boato que só serviu para destabilizar o clube e os seus adeptos. Mas acredito que, no futuro, quando o clube estiver com uma estrutura forte e uma equipa bem consolidada, poderá vir a vencer algum título europeu. E mostrar, deste modo, que o que dá vitórias no futebol é o que se faz dentro das quatro linhas.

Texto: Joana Santos