Num espaço de seis décadas o cenário mudou radicalmente no âmbito da educação. Apesar dos desafios que ainda enfrentamos, é inegável que existiu um processo de democratização do ensino português. A tecnologia abriu as portas para o conhecimento, mais escolas foram criadas e o apoio financeiro revelou-se fundamental para tornar a educação mais acessível.
Há pouco mais de sesenta anos, a realidade era outra. O acesso à educação era inalcançável ou melhor um privilégio para poucos, reservado para aqueles que descendiam de famílias mais abastadas. Os cursos universitários eram escassos e muito caros, o que limitava ainda mais a entrada para o ensino superior.
Hoje, felizmente, o panorama é mais otimista. Mais pessoas podem seguir os seus sonhos e construir um futuro melhor para si e para as suas famílias. Apesar dos obstáculos que ainda enfrentamos, a democratização do ensino é uma vitória numa guerra que parecia estar perdida.
Há cerca de sessenta anos, os estudantes uniam-se para travar o clima de tensão do regime salazarista. Combatiam vorazmente a opressão asfixiante que se fazia sentir em Portugal e almejavam um ensino superior digno. Contudo, a História repete-se.
Somos jovens com projetos, com esperanças e com vontade de viver o mundo. Somos jovens que sonham, mas há um país que teima em acordar-nos. Um país que nos lança um balde de água fria na cara destruindo os nossos sonhos como quem quebra um simples copo de vidro. Tentamos arduamente, e com um peso nas costas de não desistirmos, procuramos juntar os pedaços de vidro que caíram e construímos novamente o copo.
Neste dia, 24 de março de 2025, é urgente fazermo-nos ouvir! É imperativo usarmos a nossa voz para combater todos os obstáculos que surgem no caminho. Não podemos permitir que o nosso próprio país condicione e destrua os nossos sonhos, projetos e ambições quando foi esse mesmo país que nos prometeu o acesso a tudo isso.
Nem todos partem do mesmo degrau, nem da mesma escada. Aliás, a falta de equidade é tanta que há alunos que estão no rés de chão e outros nas águas-furtadas, neste edifício do elevador social. A área académica que escolhemos é marcada por diversos contingentes que nos vão moldando ao longo do tempo. O ambiente familiar é um dos principais fatores que influencia a tomada de decisão aquando da entrada no ensino superior. O social é também um deles. As pessoas à nossa volta influenciam a nossa perceção sobre o ensino superior e a forma como construímos os nossos objetivos de vida. A pressão da empregabilidade assola-nos, preocupa-nos e exerce uma força preponderante na escolha do curso, condicionando-a de forma preocupante.
Se há sessenta anos lutávamos por melhores condições do ensino superior, hoje continuamos nesta luta que parece não ter fim à vista. Há sessenta anos lutávamos pela falta de liberdade, hoje, as propinas, as taxas e os emolumentos erguem-se como a principal barreira na entrada para o ensino superior. Se há sessenta anos lutávamos por combater a opressão asfixiante que se fazia sentir em Portugal, hoje lutamos para pagar o preço do alojamento de um mísero quarto. É inconcebível que no século XXI ainda haja estudantes a viver em condições precárias, com infraestruturas deficientes.
Merecemos mais! Somos o futuro deste país e a nossa formação é muitas vezes deficitária, inclusive em termos de instalações. A inadequação de salas de aulas e materiais traduz-se num obstáculo acrescido ao processo de aprendizagem, mas isso é apenas a ponta do icebergue. Reclamamos a gratuitidade, o fim permanente da propina, residências para todos os estudantes, mais bolsas, uma maior representação estudantil e uma revisão urgente no Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior tornando-as, efetivamente, um espaço democrático.
E assim, inspirados e resilientes, não podemos baixar os braços. Que as palavras de Jorge Palma ecoem como um hino, impulsionando-nos a seguir em frente, a persistir, a acreditar que, “enquanto houver estrada para andar, a gente vai continuar”.
Tiago Delgado