A moção de confiança apresentada pelo Primeiro-Ministro foi debatida e votada na passada terça-feira, dia 11 de março, e foi chumbada com votos contra de toda a oposição, exceto a Iniciativa Liberal.
Não é a primeira vez que um líder do poder executivo apresenta uma moção de confiança. Já aconteceu 11 vezes, e a última foi no Governo de Pedro Passos Coelho, que conseguiu ver a moção aprovada. A moção apresentada por Montenegro é apenas a segunda vez na história da democracia portuguesa que um Governo cai por via do chumbo da moção de confiança. A primeira vez aconteceu com Mário Soares, em 1977, à época secretário-geral do Partido Socialista.
Cronologia: O que levou à queda do Governo?
A 15 de fevereiro, o jornal Correio da Manhã noticiava que a família de Luís Montenegro possuía uma empresa imobiliária que também assegurava serviços de “consultoria de gestão, orientação e assistência operacional às empresas ou a organismos (inclui públicos)”, na qual Montenegro foi sócio até junho de 2022. Depois, a empresa foi passada aos filhos e à mulher, com quem é casado em regime de partilha de bens adquiridos.
A posse desta empresa por parte da família de Montenegro pode levar a um conflito de interesses, pois o Governo aprovou, há poucos meses, a Lei dos Solos que, sucintamente, requalificou solos rústicos em solos urbanos. Ou seja, passou a ser permitido construir habitações em terrenos onde anteriormente não era possível. O PS respondeu a esta polémica comparando o caso de Montenegro com o do ex-secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território, Hernâni Dias, que se demitiu após ter sido “imprudente” ao criar duas empresas imobiliárias já depois de ter integrado o Governo.
A 21 de fevereiro foi debatida e votada a moção de censura apresentada pelo partido Chega, “pelo fim de um Governo sem integridade, liderado por um Primeiro-Ministro sob suspeita grave”. Só o Chega votou a favor desta moção. Os restantes partidos, à exceção do PCP, que se absteve, votaram contra.
A 5 de março foi a vez do PCP apresentar a sua moção de censura, intitulada “Travar a degradação da situação nacional, por uma política alternativa de progresso e desenvolvimento”. Para além da já abordada polémica empresa familiar de Montenegro, o Partido Comunista apresentou outros motivos para esta moção de censura, que envolvem política fiscal, salários e pensões, privatizações, educação, imobiliário e guerra. PCP, Bloco de Esquerda, Livre e PAN votaram a favor da moção de censura, enquanto o Partido Socialista e o Chega se abstiveram. Para além dos partidos que compõem o Governo, PSD e CDS-PP, apenas a Iniciativa Liberal votou contra.
A moção de censura foi novamente chumbada, mas o debate ficou marcado principalmente pelo anúncio da moção de confiança por parte do Primeiro-Ministro, que acabaria por ditar o fim do Governo.
O dia 11 de março foi o derradeiro. Um ano e um dia depois das eleições que deram a vitória à AD, estava a ser debatida a queda do Governo. Foram quase três horas de debate, entre apelos e propostas por parte do Governo para o principal partido da oposição. Luís Montenegro prometeu “suspender a sessão” caso o PS entregasse uma lista com as perguntas que queria que fossem respondidas. Como resposta, Pedro Nuno Santos propôs a Luís Montenegro que “retirasse a moção de confiança” e aceitasse uma Comissão Parlamentar de Inquérito sobre a empresa. Já por volta das 19h00, o CDS-PP apresentou um pedido de interrupção dos trabalhos, o que levou a um intervalo de uma hora entre o debate e a votação. Foi durante este intervalo que o Governo tentou negociar com o PS, mas as negociações acabaram por não dar em nada.
Ao fim do dia, acabou por acontecer o que estava previsto. Apenas a Iniciativa Liberal apoiou o Governo; a restante oposição votou contra a moção, fazendo, pela segunda vez na história, um Governo cair desta forma.
Apesar do chumbo da moção de confiança determinar automaticamente a queda do Governo, esta não determina novas eleições. Aliás, quando o Governo de Mário Soares caiu pelo chumbo da moção de confiança, o então Presidente da República, Ramalho Eanes, optou por não dissolver a Assembleia da República, e foi formado um Governo conjunto entre PS e CDS-PP, liderado por Mário Soares.
Marcelo Rebelo de Sousa já convocou os partidos e o Conselho de Estado para reunir esta quarta e quinta-feira, dias 12 e 13 de março.
Miguel Vinagreiro
Imagem: AFP