“O que existe depois do amor?”- perguntaram-me.
Não soube responder. Ficaria com medo se soubesse. Depois do amor não há nada. Nada pode haver, porque algo colossal como o amor não acaba, não se extingue, não deixa de existir. Quem ama hoje não imagina o amanhã sem o amor. E a dor chega quando chega, também, esse amanhã e quando com ele chega, também, a dor, a solidão, a distância e indiferença, quando chegam as noites mal dormidas e as olheiras vincadas pelo tempo que parece não passar.
Mas passa. Tudo passa. Só a dor parece não passar.
Mas não se lhe abre a porta, ela não precisa de cerimônias. Chega a tempo e horas, traz com ela uma mala cheia de mimimis, de tempestades em copos de àgua, de vinho branco e de sumo de laranja, arromba portas, descose costuras e acaba com a postura de quem tenta fingir que nada se passa. Está tudo bem.
– Não, não está.
Depois do amor não há nada. É estrada cheia de linhas contínuas que não podemos ultrapassar, linhas essas que são tatuadas e cravadas na pele (e no coração) pelas memórias que não se apagam, que não se desgastam, que não perdem a cor. Não existem memórias a preto e branco para quem ama com todas as cores, letras e sabores que conhece.
Que fragilidade poética esta de continuar a escrever sobre o amor.
Que intensidade desumana esta de nunca querer saber o que há para lá das quatro letras sem medida.
Não gosto de pensar sobre a ideia utópica do “nada” quando sempre sonhei, dei e idealizei o “tudo”.
Não gosto de pensar no que existe no “depois” quando ainda amo no “agora”.
Somos seres selvagens que fingem casualidade e elegância, somos almas perdidas num mundo carregado de falsas e fingidas certezas.
Somos seta de cupido quando percebemos que, às vezes, precisamos de voltar atrás para que nos seja possível seguir em frente.
Somos travão e acelerador, caixa de velocidades e piscas. Deambulamos, andamos ao redor, mas voltamos sempre ao amor.
Porque ele é início, meio e fim.
Porque nada neste poema da vida faz sentido se não rimar com o verso só e intenso, amor.
“O que há depois do amor?”
Mi Mi Mi. Mimimi.
Deduzo que haja silêncio, que tudo seja a preto e branco. Deduzo apenas.
Porque num mundo de dúvidas e reticências, certeza tenho de que, um dia, quando o último suspiro se aproximar e a vida pelos olhos me passar, não saberei, ainda, o que existe depois do amor. Porque passei, passo e passarei toda a minha vida a amar, sem nunca querer saber o que há depois disso, depois do “tudo”.
Porque o amor é tudo.
E depois dele não há nada.
Maria Filipe